sexta-feira, 25 de junho de 2010

CONTOS DO MUNIR - 43

O SANHAÇO AZUL
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Era uma vez um filhote de passarinho...

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Era pequenino, ainda sequer sabia voar direito quando foi encontrado. Caiu do ninho que tinha forma de uma taça, lá do alto da amendoeira. Seus pais eram urbanos e nem por isso, menos cantadores. O trinado deles era de um violino um tanto estridente, mas agradável, parecia um canto de sedução recíproca.
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O menino ficou sem saber o que faria com aquele passarinho que já começava a se colorir de azul. Tinha alguma intimidade com cachorrinhos, esse bichinho era diferente e uma estranha novidade.
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O garoto pegou com cuidado o passarinho e o levou para casa, viu que não estava machucado e que ele parecia olhá-lo como se estivesse agradecendo. O guri ficou imaginando que tipo de comida ele comeria, por intuição deu-lhe um pedacinho de mamão, parecia que aquela era sua comida preferida tal a voracidade com que ele o fez desaparecer.
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E ai começa uma história de amizade entre um menino que cresce e um pássaro azul.
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O menino deu o nome ao sanhaço de Blue e disse se chamar Lucas, o sanhaço em seu pio chamou o menino de Luc, e passaram a se entender.
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Era verão, época de acasalamento dos passarinhos e o gorjeio de atração era ouvido em todo o quintal da casa do menino. O Blue maravilhado com aquele cantar, diferente da voz do garoto que ele também gostava de ouvir.
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O Luc, de férias, não saía de perto de seu novo amigo, sempre lhe dando o pedacinho de mamão e água com um pouquinho de açúcar em uma colherzinha. Nos primeiros dias o Blue, não negando sua natureza arisca, se esquivava e aos poucos se acostumou com seu amigo e já vinha beliscar a fruta em sua mão.
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Luc tinha receio de que o sanhaço fosse embora, ele já ensaiava seus vôos solo, mas pensava que prendê-lo em uma gaiola seria uma crueldade. Escolheu deixá-lo solto. Afinal era melhor ver o seu amigo livre.
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As aulas recomeçaram, Luc estudava pela manhã, na véspera conversou com Blue, disse que iria sair demanhãsinha, mas iria deixar seu pedacinho de mamão e sua água açucarada prontos. Blue ainda não compreendia bem a linguagem dos humanos, mas entendeu que o rango estava garantido.

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Luc ao regressar do colégio não encontrou seu amiguinho, pensou que ele fugira e quase se arrependeu de não tê-lo mantido preso.
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Naquela noite foi dormir triste, foi acordado bem cedinho com um chilrear na janela de seu quarto, era o Blue já cobrando o seu café da manhã.
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Luc foi caminhando para o colégio e o Blue o acompanhou voando pelas árvores. Virou rotina aquele passeio matinal.
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Na manhã do dia anterior tinha saído à procura de seu amigo, ao campo de futebol, ao morro onde o Luc soltava pipa, voltado quase à noitinha sem encontrá-lo.
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Chegando dezembro o Blue parou de acompanhar o Luc. O menino notou que o canto do sanhaço havia mudado menos estridente, mais melodia e mais demorado. Havia uma resposta de um trinado mais suave de acordes que pareciam dizer sim.
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O Blue trouxe uma companheira compartilhando com ela o seu pequeno almoço. Dali a dois meses, novos pequenos Blues apareceram.
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O tempo foi passando a passarinhada foi crescendo e o menino também, alguns sanhaços ficavam por ali, outros iam para a mata na encosta do morro procurar suas futuras companheiras.
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Em certo dia, no café da manhã, o Blue beliscando seu pedaço de fruta na palma da mão do Luc, ouviu que ele dizia:
- Blue a partir de amanhã eu já não estarei aqui todos os dias, entrei para a Escola Naval e só virei para casa a cada duas semanas passar o sábado e o domingo. Você e os seus sabem já procurar, nos mamoeiros e amoreiras que eu plantei o que precisam.
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O Blue agora mais familiarizado com a linguagem humana entendeu o que o Luc dizia; parando de comer virou sua cabecinha e repetiu o pio de sua primeira conversa:
- Luc!
Foram vinte e cinco anos passados pelo Blue cativo, não em uma gaiola, mas na amizade que lhe deu liberdade para voar.
Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com

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