segunda-feira, 20 de maio de 2013

CONTOS DO MUNIR 006/2013



Um Inglês no Carnaval de Salvador-BA
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Esta é uma história real. Nomes, nacionalidades, profissões, lugares foram propositadamente trocados.
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João Araujo é militar, a mulher tem irmã que vive na Inglaterra, todos os anos, passam pelo menos quinze dias em Londres. Lá o médico ortopedista Bill tornou-se amigo da família por socorrer e atender com sucesso o sobrinho deles. Bill, embora casado e com um filho, é gay.
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João, coronel do Exército mora em Salvador, Bahia, em frente ao mar. Em um dos bairros mais nobres da cidade, Rio Vermelho, alguns cantores famosos baianos têm casa lá. A viúva de Alfredo Saad, moradora da cobertura do edifício Chopin, ao lado do Copacabana Palace, mudou-se para lá.
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O médico inglês viu fotos de Salvador, das praias, da Igreja de São Francisco; encantou-se.
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Convenceram João a hospedar Bill em sua casa, quando o inglês viesse ao Brasil. Não veio homofóbico, mas relutante, concordou.
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Era o mês de fevereiro, carnaval.
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O doutor veio só, ficou alojado no apartamento de João, no mesmo quarto onde dormiam os cunhados ao visitar o Brasil. À noite, saiu para ver de perto a batucada.
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O coronel e esposa costumam dormir cedo, ambos não deixam a prática de exercícios pela manhã bem cedo na Academia.
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Era madrugada, quando a secretária da casa bate à porta de João.
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-Coronel, tem gente estranha aqui!
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João, desperto, foi até o quarto do médico; a porta trancada, a luz acesa, bate e chama:- Bill!, Bill
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Sem resposta, insiste. Nada. Espia pela fechadura, não consegue ver o ortopedista, mas vê um rapaz forte sentado na cama. João pega seu revólver. Arrepende-se e resolve deixar o caso para a polícia. Desce vai até a rua, relata o ocorrido a uma radiopatrulha. O Sargento, experiente, chefe da patrulhinha, pergunta, ironicamente, se o cara é gay. Os policiais decidem chamar o BOPE.
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Em menos de cinco minutos, sobem ao apartamento do coronel.
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São quatro homenzarrões, equipados com capacetes e coletes à prova de bala, empunhando metralhadoras; batem e gritam na entrada do quarto inutilmente. Perguntam-lhe se podem arrombar. Diante da resposta afirmativa, derrubam a porta.
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Um policial corre para a janela, os outros três imobilizam o garotão que é revistado e algemado.
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O estrangeiro, vestido de baiana e de peruca loura, está deitado no piso do quarto, o vômito espalhado ao seu redor. Tentativas para acordá-lo são feitas sem resultado. Tinha sido vítima do “Boa Noite Cinderela”.
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O coronel acompanha os policiais até a rua, que perguntam:
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- O que o senhor quer que a gente faça com ele?
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Já, o sargento diz:
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- Tem algum pra nós?
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João dá duzentos reais e diz para levar o rapaz preso.
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O coronel chama a ambulância, o médico só acorda no dia seguinte bem tarde, sua mala está no quarto do hospital, um endereço de um hotel onde já tem um quarto reservado, e a passagem de retorno a Londres já marcada.
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Dois dias depois, a empregada entrega ao dono da casa a meia que achara na gaveta embutida na cama do quarto de hóspedes. Dentro dela, mil e quinhentos dólares.
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Voltando à Inglaterra, João procura Bill e lhe devolve mil e quatrocentos dólares.
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Não diz nada, mas está descontando a propina paga ao sargento da patrulhinha.
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E Bill:
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-Sorry John, but I loved the Bahia Carnival huum, huum...Geez, next year, I’ll be back.
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-Desculpe João, mas adorei a Bahia, Carnaval huum, huum...
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NOOSSA! Ano que vem, eu voltarei.
Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com

terça-feira, 14 de maio de 2013

ARTIGO DO MUNIR 4


CRÔNICAS E CONSEQUENCIAS 4
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Agosto de 1971 a Policia Civil, cerca o Colégio André Maurois, destitui e prende a diretora Henriette Amado. Os alunos se revezam em vigília inútil por três dias. Depois de algumas semanas de tensão, um grupo, do qual fazia parte o filho mais velho do Comandante Munir, consegue reabrir um diálogo com o novo diretor para reestabelecer, pelo menos em parte, a “Liberdade com Responsabilidade” e organiza, com apoio da direção, um campeonato de futebol entre as turmas do colégio. Até hoje, esse grupo venera o lema da saudosa ex-diretora Carlinhos em sua última crônica parece evocar Henriette no relacionamento disciplinar-hierárquico existente entre tripulantes e oficiais a bordo de um submarino. Por outro lado apesar de ser jornalista e não estrategista, já vislumbrava o emprego do submarino em sua missão mais importante: a defesa de nossa plataforma continental, que sabemos hoje possuir grandes reservas de petróleo.
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O que parecia um inferno astral para o Comandante do Bahia, após a última crônica do Carlinhos, transformou-se em mar de Almirante. O Chefe da Esquadra, também submarinista, orgulhoso de como foram tratados os marinheiros das profundezas, não poupou elogios.
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Munir Alzuguir já integrava a lista para promoção por merecimento, seus temores de ser preterido pelo episódio se dissiparam, quando foi alçado a Capitão de Mar e Guerra ainda no comando do Bahia.

O “passeio de submarino” chegou à Presidência, então Governo Militar, e foi citado como exemplo a ser seguido por autoridades castrenses para o estreitamento das relações entre civis e militares.
Manolo promoveu no Antonio’s um jantar com a oficialidade do Bahia (cavaquinhas deliciosas).

Carlinhos, pouco ligando às críticas de seus companheiros de imprensa, continuava a bebericar seu uísque e fumar seu cigarrinho no canto da boca. Frequentou algumas vezes à casa do agora ex-comandante do Bahia.

Em determinada ocasião, escondeu em seu apartamento um jornalista procurado pela Policia Civil. Nesse mesmo dia, por uma dessas ironias do destino, seu agora conhecido oficial de Marinha, bateu à sua porta, convidando-o para o aniversário de sua filha caçula.

Carlinhos foi; ficou pasmo quando o comandante entregou a ele um pacote amarrado com barbante. Era seu primeiro romance manuscrito, em Vila Velha no Espírito Santo, aos dezesseis anos.
Nunca soube como aquilo fora parar nas mãos de um militar. Depois, em um romance, disse acreditar que o Serviço Secreto da Marinha, “CENIMAR” tinha empreendido busca em sua casa. A história na verdade era bastante diferente: O irmão suicida de um parente do comandante, muito amigo de Carlinhos, pedira que fosse entregue ao agora jornalista de sucesso, o seu primeiro romance, fato omitido propositadamente para evitar tristes recordações.

Dois anos mais tarde, o Comandante Alzuguir, avaliado por uma comissão da Diretoria do Pessoal da Marinha embarcava com a família para os Estados Unidos em missão diplomática na Organização dos Estados Americanos.

Os filhos do Comandante Alzuguir foram matriculados por determinação da Prefeitura de Maryland em escolas americanas; a menina, a caçula, foi alfabetizada novamente em inglês e mais tarde teria seu próprio cursinho.
O menino mais novo, mas muito forte, sofreu tentativas de bullying, sua reação foi tão violenta que botou para correr os zombeteiros e ele passou a ser respeitado na escola.

O do meio, que teria sido um marinheiro excepcional, passou da idade por estar na América. A carreira na Marinha agora é um desejo do seu filho, um garotão lindo hoje com 16 anos e que herdou do pai o dom para o desenho.

O mais velho, estudava engenharia na Universidade de Brasília, embarcou quando o semestre terminou e foi matriculado em uma universidade americana. Hoje, integra o quadro técnico de engenheiros da Petrobras e lidera a concessão do Selo de Eficiência Energética para fogões e automóveis.

Segue a última crônica do Carlinhos. Escrita no Caderno B do Jornal do Brasil no dia 3 de julho de 1970. Uma sexta-feira.

Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com