sexta-feira, 29 de julho de 2011

CONTO DO JOSÉ FRAJTAG - O EFEITO JANELA cap 1

O EFEITO JANELA

Capítulo 1
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Seria um entardecer como outro qualquer. Em nossa varanda no oitavo andar, eu e Helena apreciávamos a magnífica vista da praia do Arpoador, com o Morro Dois Irmãos ao fundo, quando algo me bateu violentamente no braço. Quando dei por mim, tinha uma pulseira prateada pendurada em minha mão, enquanto um vulto humano despencava rapidamente em direção ao solo, ao som simultâneo dos habituais aplausos dos cariocas, homenageando o lindo pôr do sol. Essa, eu soube depois que foi a primeira de uma série de coincidências.
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Apesar de tudo ter sido muito rápido, eu achei que o tinha reconhecido. Eu não tinha certeza total, mas ele me pareceu ser um vizinho recente, que morava na minha coluna, no décimo andar. Eu olhei para baixo e o vi caído no piso do Playground. Para meu horror, ele ainda se mexia. Ninguém passava por ali naquela hora, o que não era nada extraordinário. Nosso Play é bem equipado, com salão de ginástica, piscina e sauna, mas com a concorrência da praia em frente, dificilmente alguém o frequentava.
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-Que horror Sílvio! Gritava minha mulher!
Eu e Helena, saímos desesperados em direção ao elevador e fomos o mais depressa possível ao Playground. Pelo celular eu ia discando 190, para a polícia, alertando-a do ocorrido. Pelo interfone do elevador, Helena avisava o porteiro, pedindo a ele que fechasse a portaria até a chegada de polícia, para bloquear a saída de um eventual assassino. Pedi para Helena não vir comigo, pois esperava ver algo pavoroso. Ela desceu à portaria aguardando a Polícia.
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Ao chegar ao local da queda, fiquei estarrecido! Nada havia! O piso onde o “corpo” havia caído não tinha marcas e estava seco! Ninguém teria tido tempo de retirar o corpo, lavar e secar o piso! Em cerca de quinze minutos a polícia chegou, com um fotógrafo criminalista e com repórteres, que sempre são avisados, pois captam o rádio da polícia.
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Com gestos brutais, foram logo perguntando onde estava o corpo. Para o meu imenso aborrecimento e o deles também, eu apenas disse o que vi sem tocar no assunto da pulseira. Preferi examiná-la antes de tomar qualquer atitude, o que mais tarde descobrimos ter sido a decisão mais correta que tomei em nossas vidas.
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O porteiro falou que somente alguns moradores haviam saído e que ele não pôde impedi-los, para não arriscar o emprego. Fiquei aborrecido com essa atitude serviçal, e a polícia também, mas mesmo assim dois estranhos foram apanhados pela polícia, ao tentar sair do prédio, mas nada foi apurado com eles, que negaram todas as suspeitas. Foram levados à delegacia, com o porteiro, porém nada havia de contra eles, nem um corpo. O porteiro afirmou que os dois eram visita do sexto andar, o que foi confirmado ao telefone pelo morador, portanto foram logo liberados.
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A polícia usando lentes de aumento pesquisou minuciosamente o piso, apanhando com pinças pequenos fragmentos e varrendo até a poeira existente no Play, para posterior análise.
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Foram pesquisados os apartamentos acima do nosso. O vizinho do décimo andar tinha desaparecido do prédio e o apartamento estava vazio. O síndico consultado não conseguiu dar informação alguma, pois desconhecia esse morador. Não soube sequer dar o seu nome; ele só poderia ser um inquilino, se realmente existisse, pois os proprietários do apartamento estavam no exterior há meses e ninguém sabia onde. Não soube nem dizer se ele havia ido embora naquele dia ou um mês antes. O síndico foi severamente criticado pela polícia, pois pela lei o morador deveria ter sido registrado.
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Os fotógrafos disparavam suas câmeras impiedosamente sobre nós, com os repórteres nos mandando uma saraivada de perguntas, que mal tínhamos tempo de responder. Ficamos a princípio com a fama de sermos um casal que sofreu uma alucinação devida provavelmente ao uso de drogas. Chegaram a afirmar que sabíamos que aquele apartamento estava vazio e que criamos um vizinho imaginário. Protestamos veementemente contra essas suspeitas infundadas e mostramos que éramos bastante confiáveis. Poderiam nos fazer exames que comprovariam não usarmos drogas. Além disso, éramos empresários de sucesso, que nada teriam a ganhar inventando histórias absurdas como essa..
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Os repórteres saíram em campo pesquisando se isso não seria um golpe publicitário. Ou seja, se estaríamos lançando algum produto que fosse ganhar publicidade gratuita, da qual aferíssemos grandes lucros. Nada encontraram que nos desabonasse. As reportagens, no entanto apareceram nos jornais, cada um com uma versão mais maluca que a outra.
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A análise do material coletado no playground nada descobriu! Isso aumentou ainda mais as especulações da imprensa quanto à nossa loucura!
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Um insistia na opção alucinação, outro achava que havíamos visto um holograma e outro insistia que nós estávamos bolando algum plano mirabolante para extrair algum tipo de vantagem disso tudo. Nossa sorte foi a de um porteiro da manhã, finalmente admitiu ter se lembrado desse morador, confirmando que ele realmente existia. Mostrou até uma rubrica sua no livro interno. Antes ele estava com medo e nada havia falado. Tentaram ler a rubrica sem sucesso, pois era um garrancho, que nem farmacêutico decifrava. O porteiro também não se lembrava do nome. Os repórteres e a polícia finalmente cansaram e nos deixaram em paz, mas a historia ficou registrada na imprensa como o “caso do suicida fantasma”.
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Na semana seguinte, um caminhão de mudança, esvaziou o apartamento do estranho vizinho. O motorista do caminhão estava orientado a não responder perguntas.
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A pulseira, que eu não tirava mais de meu braço, estava sempre me fazendo lembrar-me do caso. Não era possível esquecer algo tão estranho, mas eu de propósito não tocava mais no assunto, pois sempre me criava confusões.
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Com o tempo, tudo passa. Após um mês, a coisa foi esquecida por todos, menos por mim. Fiquei com uma fobia de chegar perto de janelas, que de tão radical, eu nem podia ouvir falar em janelas.
(continua...)
Autor:José Frajtag
E-Mail: josefrajtag@ymail.com


terça-feira, 26 de julho de 2011

CONTO DO JOSÉ FRAJTAG-O RESTAURANTE (cap. 3 - Epílogo)

O RESTAURANTE

Capítulo 3-Epílogo.

- O que é sashimissesushis? - Perguntou Bliza.
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- Eu ri um pouco, mas informei que são duas palavras e serão os únicos pratos de comida que não são daqui, e sim do Japão, mas caíram no gosto do Brasil inteiro: Os sashimis são feitos basicamente de finas fatias de peixes crus e os sushis são porções de arroz recheadas de peixes também crus.
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- Argh! Que horror, peixe cru! Disse ela, o que me fez levá-la e ao Frider, o amigo para jantarem em um restaurante japonês e fiz com que eles provassem. Eles foram aos céus de tanto prazer.
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Ela fez com a maior facilidade, que alguns peixes de Sfiga fossem fatiados mentalmente, e os “provou” e fez com que, pelo mesmo processo telepático eu também os “provasse”. Ambos concordamos que seria um sucesso! Eles aprenderam até a fazer o molho de soja e o de raiz forte, para temperar os peixes à japonesa. Aliás, teriam de ir ao Japão para adquirir a raiz forte wasabi e plantá-lo em seu planeta.
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Uma coisa que me chamava atenção era que eles nada anotavam. Bliza me disse que tudo o que eu dizia era momentaneamente “arquivado” em suas mentes e depois transmitido direto a um pequeno equipamento à tiracolo do tamanho de um dos nossos celulares, já traduzido para a língua Sfigatzi.
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Depois fomos visitar fazendas onde escolhemos animais de primeira linha. Estudamos o clima das várias regiões de Sfiga, e verificamos quais seriam adequados a cada vegetal ou animal da Terra. Compramos manuais de criação, sementes de grama e tudo o mais que era necessário. Dos bovinos e caprinos, eles extrairiam além da carne, obviamente o leite do qual teriam de aprender a fazer os laticínios. Só para isso, comprei uma enciclopédia para eles.
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No dia seguinte, para terminar, levei Bliza e vários de seus amigos a uma churrascaria rodízio. Quase caíram da cadeira de tanto comer e também ficaram alucinados pelo pãozinho de queijo mineiro. Então consegui as receitas e um manual de fabricação do polvilho azedo, que é o componente principal do delicioso pãozinho e também do famoso biscoito, que é vendido nas praias. Ele seria obtido através da mandioca, cujas mudas eles já possuíam. Dela eles obteriam também a farofa, que fazia Bliza chorar de prazer ao comer. Nunca pensei que uma simples farofa, fizesse tanto sucesso.
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Após dezenas de outras recomendações, ganhei uma bela recompensa em dinheiro, com o qual paguei todas as dívidas e ainda sobrou uma parte que me proporciona uma renda bem razoável.
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Com os enormes conhecimentos que adquiri, certamente mudarei de profissão. Penso agora escrever livros de culinária, virar crítico de restaurantes ou o mais perfeito nutricionista que o mundo já viu.
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A cada dia que volto ao “Carioca”, faço um enorme esforço para não por um Rei na barriga dos meus queridos Pedro e Patrícia, e aos sábados sinto saudades de Bliza, a bela Sfigatzi. @
Autor:José Frajtag
E-Mail: josefrajtag@ymail.com

quinta-feira, 14 de julho de 2011

ARTIGO DA MAGDA VON BRIXEN

Olha que coisa mais … feia
http://www.oecocidades.com/2011/07/12
Perplexidade. Tenho um filho indigenista vivendo em contato visceral com a Amazônia, e foi através dele que o Zé Castanheira entrou na minha casa um dia depois de sua morte. Vendo e ouvindo os dez minutos da sua fala mansa no TED x Amazônia – mais um Zé, brasileiro e vigoroso, contando sua emocionante história – me quedei muda. Assisti mais uma vez: o exemplo contundente de sustentabilidade, possível lá na floresta e a todos nós, sendo transmitido em palavras simples, sem demagogia ou xiitismo.

Ele mesmo transformava sua fonte – a castanheira viva – em óleo e outros derivados, mas preservando-a como a um caríssimo membro da sua família. “No meu próprio lote estou industrializando… Eu faço óleo de castanha de primeira qualidade, rico em selênio, bom pra todo tipo de comida, fritura, e se usa como óleo de oliva na salada. Do resíduo, que chama bagaço, se faz sorvete, biscoito, o que sua imaginação der pra comer… Isso já tá indo pro mercado aos poucos, o pessoal da universidade, da CPT (Comissão Pastoral da Terra) está me comprando direto este óleo, que além de ser bom pra comer é ótimo remédio, como vocês sabem: o selênio combate o câncer, agregando valor à floresta.”

Emocionante assisti-lo, dramático saber que pessoas assim estão sendo eliminadas sumariamente: simples, honesto, verdadeiro, espontâneo, calcado no script natural de quem vive coerente com o que diz, por isso mesmo flecha certeira em nossos corações e mentes. “Se o negócio tá preto, eu vou lá e tiro o cipó, faço dez cestos num dia, faço R$ 100,00; faço vinte cestos, R$ 200,00 (…) e ela (a floresta) tá lá, continua me dando, no dia que eu quero vou lá e apanho.”

Zé fazia o dever de casa, da floresta, do planeta: desenvolvimento sustentável, tema da grande conferência mundial que vai acontecer agorinha mesmo por aqui, na urbe carioca, a Rio+20, em 2012. Zé não vai mais fazer cestos, ouvir passarinhos, o balanço do vento nas castanheiras ou o estridente guincho da motosserra que cala a voz da floresta. “Ela é viável em pé. É uma coisa que você não agoa, você não bota adubo, você só tem o trabalho de ir buscar o que ela produz.”

Você que me lê, já ouviu o barulho de uma motosserra abaixo da sua janela e, em poucos segundos, o estrondo seco de uma árvore caindo? Pois é, eu já. “… Lá na minha pequena propriedade eu produzo óleo de castanha, manteiga de cupuaçu, polpa de cupuaçu, faço artesanato de cipó e em madeira. Agora, eu aproveito as madeiras que a natureza derruba, que a natureza põe no chão pra mim. E no lugar daquela que caiu, eu planto outra. Então, a floresta é sustentável, duas vezes mais em pé do que derrubada. Que quando você derruba, você só tem uma vez; e quando você deixa ela em pé, você tem ela para sempre.”

E a voz mansa do Zé acordou este barulho aqui dentro, reverberando uma memória recente – incomensurável distância entre os dois fatos em si, sua magnitude e consequências envolvidas; mas, em comum, a mesma insanidade voraz humana que não olha à frente nem para os lados, só o imediatismo de alguns poucos interesses espúrios.

16 de fevereiro de 2011, Ipanema, Rio de Janeiro.

O apartamento em que eu estava então morando na Rua Joaquim Nabuco tinha uma vista verde lindíssima de amendoeiras e uma outra espécie de árvore de copa imensa, que fazem parte do conhecido ‘corredor’ verde dos fundos da Joaquim Nabuco – ele se estende do Colégio São Paulo, no início da Av. Vieira Souto, ao prédio nº 240 da Rua Francisco Otaviano. O charme dos prédios desse local são justamente os apartamentos de fundos, pela vista verde que os separa do mar. Viveiro rico de bem-te-vis e outras tantas espécies de pássaros, famílias inteiras de micos ali vivem e se alimentam das sementes dessas árvores, produzindo uma festa diária aos olhos e ouvidos. Tudo isso em pleno bairro de Ipanema, sempre tão cantado apenas pela beleza e poesia da sua praia, das suas garotas.

Pois estava eu às 10h trabalhando no computador, de frente para este oásis, quando ouvi um barulho insistente de motosserra – achei que era mais uma obra na vizinhança. De repente, ouvi também um estrondo fortíssimo de árvore abatida e então pulei pra janela: uma das copas frondosas já era uma clareira para as janelas dos prédios nº 6 e nº 8 da Av. Vieira Souto, este último o abatedor das árvores, pois algumas delas estão no seu terreno de fundos. Da minha janela mesmo falei com um dos operários, que disse ser de uma empresa particular contratada para ‘limpar’ o excesso das copas etc. etc. Só que a ‘limpeza’ estava sendo feita cortando já a metade dos troncos de duas árvores – enquanto eu telefonava a amigos para saber o que fazer RÁPIDO, falando com o operário e, ao mesmo tempo, com meu porteiro pelo interfone, a motosserra era mais rápida ainda e já abatia a segunda copa. Os micos saltavam guinchando pra tudo que é canto e as aves voavam ruidosamente, com os bem-te-vis fazendo altos e inúteis protestos contra os céus. Vi, na minha frente, o desenho em microcosmo do que vai acontecendo por nossas matas e florestas. Impassíveis e com técnicas bem rudimentares, os operários iam em frente, balançando perigosamente em cordas que pendiam dos próprios galhos grossos que iam sendo abatidos.

No meu prédio ninguém sabia nem fazia nada, do porteiro ao síndico, que disse mesmo nada poder fazer porque as árvores pertenciam ao prédio vizinho. Não havia nem como aguardar a imprensa, porque a motosserra continuava eficiente seu trabalho a cada segundo e o resultado era irreversível!…

Telefonando para todas as instituições ligadas ao assunto, acabei descobrindo que havia o que fazer sim: acionei a PATRULHA AMBIENTAL, serviço do setor de Parques e Jardins da Prefeitura, e o caminho foi ágil e eficiente após dar o histórico e endereço do caso. Me atendeu Janaína, que rapidamente acionou um ‘patrulheiro’ já em trânsito ali por perto, Alexandre, que chegou com uma escolta policial e assim teve acesso aos porteiros e ao devido prédio depois. Facultei meu endereço para que ele pudesse fotografar o ‘abatedouro’ (antes fui até lá pegar o nº do edifício em questão para a denúncia, porque da Av. Vieira Souto não se percebia absolutamente nada, nem o barulho da motosserra…).

A motosserra parou na hora. Pude ver da minha janela a empresa se retirando. O primeiro round estava ganho, pois eles não tinham em seu poder a licença de poda, obrigatória no caso. No dia seguinte a Patrulha Ambiental me telefonou dizendo que o prédio conseguira a licença – e eles não podiam impedir a poda das árvores, somente monitorar se essa poda ficava nos limites do razoável, sem comprometer a sobrevivência das árvores. Alexandre voltou realmente à tardinha, segundo meu porteiro, para verificar o trabalho. Embora já tivessem cortado toda a copa de mais uma árvore no final da manhã e uma imensa clareira agora devassasse grande parte dos apartamentos de dois prédios, no lugar dos pássaros e micos que enchiam de paz nossos cansados olhos dos computadores, várias árvores de Ipanema, com certeza centenárias, foram então preservadas – pelo menos por enquanto.

“De nossa janela tínhamos uma bela vista arborizada que, por muito pouco, escapou de ser totalmente abatida pela sanha de uma motosserra. Ganhou-se uma batalha, mas não a guerra. Purificado pelas folhas de dadivosas amendoeiras e outras árvores centenárias, esse oásis faz parte do abençoado trecho que liga Copacabana a Ipanema – o Arpoador – e funciona como um verdadeiro pulmão da área. Ajudando a manter o ecossistema, serve de morada a pássaros, micos e outros bichinhos”, diz a proprietária do apartamento que eu então alugava, a médica Anna Saraiva, hoje moradora de Teresópolis – RJ e adepta de práticas agroecológicas – há três anos se dedica ao cultivo de plantas alimentícias e medicinais em área urbana, valendo-se da homeopatia nesse manejo.

Atualmente, para grandes podas (como esta), é necessário licença – quer dizer, é o caminho correto, muita gente não tira mesmo. Aí, se denunciado ao órgão competente, multam. O Parques e Jardins dá a relação de empresas credenciadas para fazer a poda dentro dos critérios corretos de preservação das espécies.

Para quem se interessar pelo histórico completo, o que consegui levantar é que a síndica do prédio nº 8 resolveu contratar o serviço para não correr o risco de ter que pagar indenização ao meu prédio, caso as árvores destruíssem o telhado da garagem pela queda de grandes galhos em temporais. Acontece que eu soube, por reunião de condôminos, que o telhado dessa garagem ia ser trocado em breve, pois estava realmente velho e podre. Ele é que precisava ser renovado, no lugar de retirar as copas de árvores que vão levar dezenas de anos para recuperar seu tamanho – se conseguirem! Através de alguns vizinhos mais antigos, também descobri que o ‘sonho’ do nosso síndico era justamente construir mais um andar de garagem (ela é térrea atualmente), e as copas das árvores dos prédios vizinhos, que avançavam pelo telhado da garagem, ‘atrapalhavam’!

O que resta é fazer pressão SIM, senão, aos pouquinhos, vão retirando as árvores de todo o espaço urbano com a desculpa de não comprometer o patrimônio construído; e vão construindo mais e mais garagens, na contramão de todo o bom senso e dos investimentos atuais que visam o equilíbrio do meio ambiente com o fator urbano, apontando para a crescente emergência do transporte alternativo: bicicletas, metrô, ônibus, de preferência nesta ordem…

Zé Claudio Castanheira se considerava filho da floresta. Emocionado, ele dizia: “essas árvores que tem na Amazônia são minhas irmãs. Quando eu vejo uma árvore dessas em cima de um caminhão indo para a serraria, me dá uma dor, é mesmo que eu estar vendo um cortejo fúnebre levando o ente mais querido que você tem, porque é vida, é vida pra mim que vivo na floresta, é vida pra todos vocês que vivem nos centros urbanos, porque ela está lá purificando o ar, ela está lá dando retorno pra nós…”.

Patrick Howlett-Martin, diplomata francês aqui no Rio, diz sobre o assunto: “Tive o mesmo problema no ano passado e não sabia a quem recorrer… são moradores, síndicos e porteiros que decidem cortar árvores sem o mínimo constrangimento. Tenho um pequeno apartamento na Rua Francisco Otaviano, no nº 240, que dá nesse corredor verde. Como, na época, o porteiro do prédio ao lado cortou árvores e grandes galhos do jardim dos fundos do edifício, fui averiguar quais as razões da mutilação de espécies tão sadias. Pois o estrago foi realizado por ele num domingo, cumprindo ordens do próprio síndico, que mandou cortar as árvores. ‘Coincidentemente’, em janeiro deste ano, durante uma reunião de condomínio no mesmo prédio, o síndico propôs fazer um estacionamento asfaltado no lugar do jardim, para isso tendo que cortar definitivamente as árvores centenárias do espaço. Tal proposta, felizmente, não obteve quorum e foi rechaçada, mas temo que o assunto não tenha sido enterrado de vez. É assustador…”.

Hoje, ao escrever este artigo, fui checar os telefones que, em fevereiro último, me apoiaram tanto no que considerei ser a minha responsabilidade – queria disponibilizá-los a todos. Com surpresa, os números diretos do Parques e Jardins, da Ouvidoria da Comlurb e, principalmente, da eficiente Patrulha Ambiental, foram todos substituídos e centralizados pelo número 1746, uma Central única da Prefeitura. Ao invés da atenciosa Janaína, entra o serviço eletrônico e você deve escolher a opção 3 – então uma atendente anotará sua denúncia, acionando a Patrulha Ambiental.

Quis localizar Alexandre, porque gostaria de entrevistá-lo. A atendente me forneceu o telefone da Secretaria de Meio Ambiente, à qual a equipe da Patrulha se reporta: (21)2976-3149. Ninguém atendeu a minhas inúmeras tentativas. Tomara que a eficiência do atendimento direto de quatro meses atrás não seja perdida e a Central atue com mais agilidade ainda, acionando os patrulheiros da vez.

Mas, me deu saudades da dupla Alexandre-Janaína…
Autora: Magda von Brixen
E-Mail: mvonbrixen@terra.com.br
Publicado Originalmente em http://www.oecocidades.com/2011/07/12

terça-feira, 12 de julho de 2011

CONTO DO JOSÉ FRAJTAG-O RESTAURANTE (cap. 2)

O RESTAURANTE

Capítulo 2

No sábado seguinte, vim preparado para não deixá-la escapar e fiquei mais atento. Deixei a conta paga previamente, para poder levantar-me com mais rapidez. Assim que ela fez menção de se levantar, eu fui atrás. Consegui dobrar aquela mesma rua logo em seguida a ela. O que vi quase me fez cair ao chão de susto. Ela estava desaparecendo, como fumaça! Tentei segurá-la e agarrei o ar. Acho que disse um palavrão. Nada falei com ninguém, pois com certeza achariam que eu fosse completamente pirado.
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No sábado seguinte ela estava lá de novo. Mal me viu, levantou-se e veio sentar na minha mesa. Ela , linda como nunca, disse sussurrando:
- Eu lhe devo uma explicação. Você viu coisas que não deveria ver, mas sabemos que você é confiável e correto e pode até nos ajudar.
- Como sabem ao meu respeito e quem são vocês? - Perguntei.
- Ora, Marcos, para nós é fácil. Sabemos até como é a sua cueca, que por acaso hoje é de algodão azul marinho. Você pode me chamar de Bliza. Somos de outro planeta.
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Gelei, do cocuruto ao dedão do pé, mas consegui dizer:
- Carácoles! Você me convenceu! Eu já estava achando que fosse uma pegadinha, mas além daquele efeito especial do sábado anterior, ninguém a não ser eu mesmo, saberia que minha cueca é mesmo de algodão azul. Como vocês conseguem?
- Ora isso não é nada de mais! Nós enxergamos através das suas roupas além de lermos sua mente!
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Lógico que fiquei bastante incomodado com aquele olhar que agora para mim tinha outro significado, mas ao mesmo tempo, o que estava acontecendo era um dos sonhos de minha vida. Sempre esperei que uma coisa maluca dessas acontecesse comigo. Bliza continuava a sua história:
- Desde que um de nossos agentes esteve aqui no ano passado, esse restaurante virou uma atração para gente de meu planeta Sfiga, que é o quinto da estrela que vocês chamam de Betelgeuse. A comida aqui aos sábados, é simplesmente inigualável em qualquer planeta, pois vocês usam ingredientes que não existem em parte alguma a não ser aqui! Esse feijão preto, essa carnes, as fatias de laranja e a farofa. Hummmm!
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Ao dizer isso seus olhos ficavam com um brilho que acentuava aquele seu estranho olhar.
- Olhe bem! Continuava ela, apontando para um homem – Aquele ali também é de Sfiga, e um de meus amigos. Acho que como a notícia da boa comida se espalhou, vários outros vêm de outros sistemas ainda mais longínquos. Temos meios de transporte que fazem essa distancias uma brincadeira.
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Eu pensava comigo mesmo:
"Eu sabia que eu tinha bom gosto, mas fui escolher logo o melhor restaurante, não do Rio, nem do Brasil, mas do Universo! Quase morri de satisfação!"
- E o que vocês querem de mim?
- Primeiro, manter absoluto segredo sobre tudo que você já sabe. Haverá compensações. E que você nada diga ao Pedro e a Patrícia. As consequências você pode imaginar quais seriam.
- É claro! Ou vocês acham que eu sou doido? O preço iria às nuvens!
- Depois queremos que você, como amigo deles, faça com que eles pensem nas receitas, para que possamos copiá-las por telepatia. Assim poderemos reproduzi-las em Sfiga. Faremos uma cadeia de restaurantes que nos deixará riquíssimos. Você já percebeu que somos apenas investidores que procuram uma boa aplicação para o seu capital?
- Não acredito! Vocês então são capitalistas? Eu tinha esperança de que algum gênio criasse algum sistema econômico mais avançado que o nosso. Por falar nisso, nos seus planetas vocês todos parecem, humanos; não é uma coisa estranha? Aliás, você para mim é a mulher mais linda que eu já vi. Não poderíamos nos desligar aí da sua turma e...

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Ela não me deixou terminar!
- Você anda vendo muitos filmes. Não há a menor chance de acontecer algo entre nós! Nós podemos nos parecer com qualquer forma de vida, de qualquer planeta. Isto faz com que as pessoas não se assustem. Para você eu pareço bela, mas nossa aparência verdadeira, tanto a minha para você, como a tua para nós, é a de monstros asquerosos.
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Vocês podem imaginar como fiquei decepcionado! Respirei fundo e me lamentando bastante disse:
- Tudo bem então! E no que mais posso ajudar? Isso que vocês me pediram até agora é muito simples. Acho que tem algo mais, ou não?
-Tem sim! Queremos que você seja nosso guia gastronômico. Queremos conhecer outros lugares, com outras comidas talvez não tão complicadas como essa, com ingredientes que possamos facilmente produzir em casa.

- Mas, protestei, eu não entendo muito do assunto, não sou um perito! Ela fez uma carinha de quem estava se concentrando em algo.

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Eu senti um tremor percorrendo todo o meu corpo. Aí ela disse:
- Incrementamos os seus próprios conhecimentos sobre o assunto e agora você é um dos maiores peritos mundiais em comida!
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Eu deveria ter ficado surpreso, mas depois daquela sensação estranha, tudo o mais ficou natural para mim.
- OK! OK! Mas para isso, preciso saber que tipo de coisas, quero dizer, alimentos tanto vegetais e animais, que vocês possuem no seu planeta.
- É fácil! Vamos te fazer uma projeção mental.
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Novos tremores me agitaram. De repente minha mente foi invadida por imagens, cheiros e sabores estranhos e aí soube, quase instantaneamente o que era cada uma daquelas coisas. Descobri que em Sfiga, a atmosfera era um pouco mais rarefeita, os climas eram bem variados e semelhantes aos nossos, mas em matéria de comestíveis, só havia vegetais ou peixes. As aves não voavam pois eram mais pesadas que as nossas e o ar rarefeito não as suportavam.
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Nenhum animal terrestre, nem as aves tinham carne saborosa ou mesmo comestível para os Sfigatzis. Levei-os para conhecer um restaurante de frutos do mar ou vegetariano. Conhecia um excelente, ou melhor, vários, pois o que não faltava no Centro do Rio era bons restaurantes. Levei-os a conhecer um por um. Mas daquela vez foi um desastre. Eles estavam cansados desse estilo de comida, pois era só o que existia no planeta deles. Optamos em voltar ao “Carioca”.
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Primeiro, pedimos umas caipirinhas e chamei o Pedro à nossa mesa para conversarmos. Elogiei a sua feijoada do almoço. Isso fez com que ele sem perceber, imaginasse a receita inteira, o que foi instantaneamente captado por Bliza, que me agradeceu. Pequenos detalhes eu mesmo completei, com meus novos conhecimentos técnicos, respondendo a todas as dúvidas. A caipirinha também foi aprovada, o que me fez dar a Bliza a sua receita.
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Com meus conhecimentos ampliados, percebi que todos os nossos animais e vegetais se adaptariam com facilidade no planeta deles, portanto sugeri que os Sfigatzis, como eles se chamavam, levassem para o seu planeta, casais de suínos, bovinos e caprinos, de vários tipos de aves, além de todos os cereais além do feijão e arroz. Raízes como mandioca e também, cebola, alho, azeitonas, ervas para tempero, e dezenas de frutas. Acrescentei vegetais de vários locais do mundo, que se listasse aqui, teria de escrever várias páginas. Sugestão aceita, comprei numa boa loja, sementes selecionadas dos vegetais e manuais de cultivo. Os produtos importados, eu encomendei via Internet. Em cada manual, escrevi em qual região de Sfiga as sementes poderiam ser plantadas e em que época.
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Os azeites de oliva, teriam de ser levados enlatados ou em engarrafados durante alguns anos, pois o pé de Oliva, que é a árvore da azeitona é de longuíssima maturação e levaria muito tempo até que entrassem em produção.
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Sugeri que os vegetais típicos de Sfiga fossem usados em saladas, regadas com azeite e limão. Aliás disse para que eles dessem uma chegadinha a Portugal, para levarem sementes de excelentes azeitonas. Para os seus peixes sugeri que além de grelhados, fizessem sashimis e sushis.
(continua...)
Autor:José Frajtag
E-Mail: josefrajtag@ymail.com

sábado, 9 de julho de 2011

CONTO DO JOSÉ FRAJTAG-O RESTAURANTE (cap. 1)

O Restaurante


Capítulo 1

Como sempre, eu estava naquele dia, no “Carioca”, simpático restaurante no centro da cidade do Rio de Janeiro, onde almoço todos os dias da semana, logo após o expediente da manhã, na empresa onde sou escriturário. Tenho lá meu lugar reservado, sempre rigorosamente às 13:15h. Os proprietários e “chefs” do “Carioca” são um jovem casal, Pedro e Patrícia, que passei a conhecer e considerar quase parte de minha família. Eles servem uma deliciosa comida, bem leve e adequada ao dia a dia. O nome é inventado por razões óbvias, que logo vocês saberão.
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Gosto tanto do local, que vou lá até mesmo aos sábados, que é quando eles servem uma feijoada levíssima. É raro encontrar um local no Centro, que funcione aos sábados. Lá as carnes são selecionadas sem gordura, mantendo, porém, um sabor incrível. Há também um belo buffet, com tudo o que se possa imaginar para acompanhar o prato principal. O que mais gosto é uma deliciosa carne seca desfiada com cebola. Mesmo em pleno verão, a feijoada deles sempre cai muito bem. Tranquilamente dispensei a empregada lá em casa, e agora só tenho uma faxineira, que vem de vez em quando. Raramente janto, apenas fazendo um lanche em casa mesmo. Só aos domingos, quando o “Carioca” está fechado, vou a outro restaurante.
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Reparei naquele sábado, na mesa ao lado uma lindíssima mulher, com uma saia cor de café com leite, blusa azul, alta, longos cabelos castanhos escuros e profundos olhos azuis. Ela certamente era, ao que tudo indicava, uma executiva de alto nível.
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Lógico que não conseguia tira os olhos daquela aparição. Da posição em que eu estava, conseguia vez por outra vislumbrar um pedaço de suas calcinhas, além de um par de pernas alucinógenas. Parecia-me que ela me mostrava tudo de propósito, mas ao mesmo tempo aparentava uma naturalidade tão grande que quase me convencia não perceber que estava assim tão exposta. Para culminar e para o meu assombro, uma mulher tão gostosa como ela me retribuía, lançando olhares pra lá de chamativos. Ora, sou solteiro e naturalmente levantei-me e fui cumprimentá-la:
- Olá! A vida é uma coisa estranha! Falei. Eu não conheço você e nem você a mim, mas anote tudo, pois daqui a poucos anos relembraremos com carinho esses momentos. Meu nome é Marcos, qual é o seu? Ela reagiu de modo inesperado:
- Como? Você está louco? Ela falou. Devo estar sendo mal interpretada! Não lhe dei esse direito! Disse ela, com um delicioso sotaque estrangeiro que não consegui definir. Eu achei curioso, pois o seu olhar era tão pidão, que era à prova de mal entendidos! O pior é que ela mantinha aquele olhar convidativo, mesmo ao negar o seu interesse!
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- Desculpe-me! Disse eu. Devo realmente ter mesmo entendido errado! Voltei para a minha mesa, frustrado por ter estragado uma das minhas melhores “cantadas”. Concluí que ela possuía algum tipo de desvio ocular, que me daria aquela impressão equivocada.
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A partir daquele dia tornei a vê-la várias vezes, sempre aos sábados. As vezes ela estava sozinha, ora acompanhada de outras pessoas, que pareciam estrangeiras também, pois falavam português com um sotaque carregado, ou uma língua estrangeira, que eu não conseguia identificar. Divertia-me ao olhá-los, pois eram todos meio atrapalhados com o manejo dos talheres; Volta e meia deixando algo cair ao chão. Ela estava como sempre, muito linda.
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Ela era realmente muito atraente e aquele olhar para mim me cativava tanto, que morria de inveja dos amigos que frequentavam a sua mesa. Além de ficar super excitado com o show de pernas e calcinhas, que continuava. Num dos dias em que ela estava sozinha, resolvi insistir, sendo novamente repelido com veemência. Mas eu sou persistente e daquela vez, esperei que ela saísse e resolvi segui-la. Não sabia ainda como faria para abordá-la e deixei o destino decidir como seria.
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Ela saiu do restaurante, e dobrou uma esquina entrando numa das ruas estreitas que existem no Centro do Rio. Quando dobrei a rua, tentando acompanhar seus rápidos passos, ela tinha sumido! Olhei para todos os lados e como todas as portas estavam fechadas, fiquei estarrecido.
(continua...)
Autor:José Frajtag
E-Mail: josefrajtag@ymail.com

quarta-feira, 6 de julho de 2011

CONTOS DO MUNIR 70

Visita







Final




A regra dos três “S” da boa presença: “Surgir, Sorrir, Sumir”.
(A regra dos 3 S vale não apenas para a boa presença, mas também é uma "arte da conquista" feminina!)

Fred sentia muito a falta de Nicole. Entretanto, sua busca não poderia parar. Tinha um prazo definido para seu retorno. As mensagens, recebidas nos seus desmaios, o lembravam sempre.
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Empreendeu só as caminhadas. Pouco antes do nascer do sol, cruzou novamente o Canal da Visconde de Albuquerque, uma subida íngreme pela Rua Aperana o levou até o local chamado Sétimo Céu. O dia sem nuvens. O crepúsculo matutino dourava o horizonte a leste. Estava em um platô de onde se via do Leblon ao Arpoador. O sol subia rápido iluminando o mar azul. Achou mais bonito que o por do sol, quando o pessoal na praia em Ipanema batia palmas. .
No platô, um memorial: Uma placa de vidro de quase dois metros e de grande espessura lembrava, com igual número de andorinhas em vôo, incrustadas em seu interior, as vítimas do acidente aéreo ocorrido em 2009.
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Foi almoçar, nesse dia, em um dos restaurantes da Dias Ferreira, um verdadeiro Pólo Gastronômico. Os melhores Chefs do Rio e São Paulo ali se fazem representar: CT, Sushi Leblon, Quadrucci, Carlota, Zuca, Doce Delicia, Manekineko e outros tantos. Alguns, até famosos, oferecem almoço executivo.
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Deixou para a parte da tarde os bares: Tio Sam, Belmonte e Azeitona, (lembrou-se que Nicole havia dito que no Carnaval sambara lá com uma passista da Mangueira), outro boteco também chamou sua atenção: o Chico e Alaide.
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Com Nicole ausente, estabeleceu uma rotina, tomava seu café da manhã, que era excelente, no hotel, caminhava até a praia, às vezes alugava a bicicleta ou ia a pé até ao Arpoador. Acabou se enturmando com os locais de lá, onde ficava conversando na praia, ou no quiosque de um camarada sempre mal humorado (achou que era por isso), chamado Napoleão.
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Seu almoço, quase sempre na Dias Ferreira, ou, caminhando um pouco mais, ia à Conde Bernadotte, repleto de bares e restaurantes, onde TVs transmitiam jogos de futebol de canais exclusivos. Um bar de sucos orgânicos era muito apreciado. Por receio, não quis experimentar.
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À tarde, ia ver se Nicole voltara, como sabia que ela gostava de Livrarias, passava pela Argumento, que também tem um Café nos fundos o Severino. Lá uma plaquinha indicava: Café do Próximo-2 (o dois escrito a giz). Perguntou o que era: “Uma tradição vinda de Praga, onde, certa vez, alguém deixara um café pago, para quem não tivesse trocado para pagar”.
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Em um sábado, ao voltar da praia, viu Nicole caminhando em sua direção, usava malha preta de ginástica, quase não quis parar. Fred insistiu para tomarem um café no Armazém. Ficaram ali conversando. Fred notou seu rosto marcado por duas manchas roxas, ela explicou: Era da máscara de esgrima. Parecia mais de agressão. Marcaram um lanche no Garcia & Rodrigues.
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A capacidade de recuperação de Nicole era incrível, quando veio as manchas roxas já não mais existiam.
Os dias seguintes foram de extrema alegria para Fred, Nicole conduzia Fred pelos locais mais atraentes do Leblon.
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À tardinha iam a algum bistrô, foram ao Stuzzi, Balada, Venga, Bracarense, nenhum dos dois tinha o hábito de jantar. Nicole gostava de comida japonesa, Fred só comia o que não fosse cru.
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Ao cinema, no Kinoplex do Shopping Leblon ou no Cine Leblon. Quando Nicole não gostava do filme, nada dizia, saía para comprar pipoca e comer do lado de fora.
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Certo dia, caminharam pela Ataulfo até ao Jardim de Alá. Fred contou dezoito farmácias, achou o local bonito, digno do nome. Alá talvez não estivesse contente com o tratamento dado àquele seu recanto.
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No retorno, viram os edifícios dos jornalistas, lembrou-se que o Cacá, um dos frequentadores da mesa da Pizzaria Guanabara, provavelmente o único não rico de dinheiro, mas milionário de coração, havia dito que morava ali.
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Entraram no Alemão e Nicole, abrindo uma exceção, dividiu com Fred um mil folhas (ela não comia doce).
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Já haviam saído juntos inúmeras vezes, Nicole sempre o acompanhava até a porta do hotel. Desta vez, disse querer subir. Fred ponderou que não valeria à pena. Sua rotina era desmaiar, ainda pelos efeitos da viagem, tão logo avistasse sua cama. Nicole, insistindo, subiu com ele.
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Como Fred havia previsto, deitou-se ainda vestido e entrou na espécie de coma que o acometia diariamente. O efeito duraria ainda por mais uma semana ou duas.
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Fred despertou ao raiar do sol infiltrado pelo blecaute da cortina.
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Estava nu, seu corpo untado com um óleo aromático, deitado em um lençol de cetim negro, os braços em cruz, os pulsos algemados na cabeceira do leito. Nicole, na borda da cama, os seios cobertos somente por suas melenas louras, a expressão inusitada e plena de felicidade, disse:
“Tive que prender você, estava muito agitado, receei que se machucasse, não se assuste, já vou soltá-lo.”
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Inclinou-se sobre ele, os braços estendidos para liberá-lo das algemas, o torso nu a tocá-lo. Fred sentiu o corpo de Nicole perfumado de óleo de morango.
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Fred viu, surpreso, na axila direita de Nicole o símbolo do anel incompleto, na fenda, três órbitas a se cruzarem. Perguntou a Nicole se sabia o que aquilo significava.
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Nicole iniciou sua história: “Meu pai era um Naturalista na terra em que nós nascemos. Foi o descobridor da vacina para vegetais comestíveis que acabou com os transgênicos e os orgânicos. Íamos para a Amazônia em busca de um fitoterápico. Uma forte tempestade solar nos fez mergulhar no oceano, nas proximidades de Fernando de Noronha, papai desapareceu, minha irmã caçula e eu fomos recolhidas por um helicóptero da Força Aérea. Alguns anos mais tarde, minha irmã, não resistindo às variações gravitacionais, veio a falecer. Casei, tive o menino que você viu, me divorciei.
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Agora... encontrei você!!!”
Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com

sábado, 2 de julho de 2011

CONTOS DO MUNIR - 69

Visita

Parte 4

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No outro dia, feriado, Fred resolveu caminhar até a praia, desceu a Rita Ludolf, passou em frente ao Cafeína, ao Armazém do Café, de onde provinha um aroma delicioso, o Origami colado. No outro lado da rua uma doçaria chamada Colher de Pau. O Gula-Gula na esquina da San Martin e a boate ou danceteria Melt, defronte. Dobrou ali, Fred queria olhar o canal da Visconde de Albuquerque, afinal o seu sobrenome era esse. Viu o bistrô Chez L’Ami Martin e o Black Bar, onde, à noite a paquera masculina e feminina se processava; a hostess, a mais cobiçada.
Fred ficou decepcionado, quando viu o canal.
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Foi até a praia, era o final do Leblon, uma escultura em bronze em tamanho natural, homenageava o antigo colunista Zózimo, aos seus pés, uma máquina de escrever portátil Lettera 22.
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Na pracinha: Um candelabro judaico, (Chanukiá).
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Um cartaz anunciando estudos para instalar ali, uma nova Academia da Terceira Idade. Cristiane Brasil.
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Um senhor e seu filho André (André Bikes), moradores da Rocinha, consertavam e alugavam bicicletas.
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Fred alugou uma, foi pedalando. No Baixo Vovô, os gêmeos jogavam vôlei, outros assistiam, o Dr. Mario caminhava com sua bengala, usada mais por charme. Fred foi até ao Arpoador. A magia e o magnetismo do lugar agitaram novamente suas endorfinas, o ISH ali era também elevado.
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Voltou pela Aristides Espínola. No princípio da rua, Mercedes, BMWs, Volvos e Ferraris estacionados, seus donos almoçando no Antiquarius.
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O Veloso se agitava, rapazes e moças bebendo chope; as moças, de shortinho, sentadas em cima das mesas por falta de espaço.
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Fred foi dar bem em cima da Diagonal e da Guanabara, onde em uma mesa comprida se reuniam aproximadamente 17 pessoas. Estavam comendo cozido feito na casa de alguém da turma, garrafas de vinho, chilenos, franceses e uísque de doze anos, também trazidos, embelezavam a toalha branca.
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O dono da Pizzaria, o espanhol Chico Recarey, não se importava muito. Eles, além de consumir muito chope, eram uma atração para novos clientes. E mais: alguns eram fiscais de renda aposentados, todos ricos: donos de Shoppings, postos de gasolina, imobiliárias, corretores da Bolsa, advogados de sucesso e alguns almirantes não tão ricos. Moravam na Delfim Moreira ou em coberturas nos arredores.
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Uma senhora idosa apareceu, vendendo canetas esferográficas parecia uma daquelas feiticeiras de histórias em quadrinhos. O Leão (antigo rigoroso fiscal de rendas, creio que foi ele quem batizou o Imposto de Renda) sempre comprava umas dez, o dono do Shopping a expulsava. O Tião veio com sua cara preta, sorrindo com seus dois únicos dentes, usando dois chapéus, batucava um pandeiro, cantava desafinado. O grupo se apressava a dar logo os trocados para que ele sumisse. Recolhia as moedinhas em um dos chapéus e se mandava.
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Quando passava uma moça bonita, todos batiam palmas.
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Fred ficou ali parado, o pessoal o chamou para que se juntasse a eles. Fred agradeceu, sentou-se junto a um canadense, que vinha de férias, uma vez por ano, adorava o Leblon, tinha um prazer enorme naquele convívio. Fred sentiu ali o intenso ISH.
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As horas passaram e carros de luxo com motoristas ou esposas apareciam para buscar os etílicos.
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O hotel de Fred é bem ao lado, ele subiu e esperou o fim do entardecer para encontrar Nicole na Livraria Saraiva.
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Ela não apareceu nem naquele dia e tão pouco na semana seguinte.
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Fred lembrou-se de algo que ela havia dito:
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A regra dos três “S” da boa presença: “Surgir, Sorrir, Sumir”.
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A série poderia terminar assim.
(Continua Parte 5 - Final - AGUARDEM)
P.S.:

Como este conto pretende ser interativo (pretensão do autor que ignora se é lido ou não) o final será escrito após sugestão dos leitores. Apelação do autor.

Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com