sábado, 29 de junho de 2013

CONTOS DO MUNIR 009/2013



SONHO? PESADELO?
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Seu vestido era branco recortado na lateral, mostrava seu esguio corpo nu, sua beleza emoldurada por longos louros cabelos. Pálida, cor de estátua, lembrava uma deusa romana, trazia consigo dois enormes cães negros com focinheiras. Era ao mesmo tempo uma visão sacra e profana.
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Os cães eram ferozes, disse-me que ficasse imóvel. Os cães rosnavam, fiquei ali inerte, não sei se por medo ou êxtase de vê-la.
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Alguém que a conhecia aproximou-se. Talvez fosse seu marido, irmão ou guarda-costas. Sussurrou que me afastasse dali lentamente, que ele seguraria as duas feras. Comecei a movimentar-me o que enfureceu mais ainda os cães.
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Quando eu estava a uns dez metros, os cachorros foram soltos, já sem as mordaças, vieram em desabalada carreira em minha direção.
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Um pedaço de cano estava no chão, arremessei-o desesperado ao primeiro cão, que o engoliu, caindo e explodindo de dor. Não me lembro do que aconteceu depois, sentia muito calor, estava banhado de suor.
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Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com

quarta-feira, 26 de junho de 2013

CONTOS DO MUNIR 008/2013



O ROUBO QUE 
NÃO HOUVE
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Edilberto fez concurso para o Banco do Brasil. Com a criação do Banco Central, para lá foi requisitado. Funcionário exemplar passou a exercer uma função de confiança no Meio Circulante, divisão que tinha entre suas atribuições, a de regular a quantidade de moeda, recolhendo ou distribuindo quando necessário. Dispunha de várias caixas-fortes. As notas desgastadas pelo uso, ou que seriam substituídas por novas emissões ali eram guardadas e mais tarde incineradas. Edilberto era de família de classe média, desde menino achava injusto que alguns tivessem muito dinheiro, outros pouco e muita gente fosse pobre.
Embora católico, não era praticante, um pouco incrédulo em relação ao céu e inferno. Acreditava mais no poder do dinheiro... Que a felicidade era terrena- não que o dinheiro tudo comprasse, mas que um mínimo dele era necessário.
Achava um desperdício queimar aquela dinheirama toda com tanta gente precisando.
Um pensamento martelava sua cabeça, o que poderia ele fazer? Não era rico, fazia contribuições mensais para associações de auxílio aos cegos, aos doentes de câncer, a crianças órfãs e outras tantas casas de caridade. Sentia não poder doar mais.
Anos se passaram e Edilberto passou a ter a responsabilidade de uma das caixas-fortes, localizada no térreo. A ele cabia despachar, no carro blindado, o numerário a ser incinerado em um forno da Cervejaria Brahma localizada nas proximidades.
Edilberto imaginou que poderia utilizar aquele dinheiro em uma causa mais nobre, distribuí-lo por aquelas instituições tão necessitadas.
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Iniciou o procedimento que tinha em mente.
As notas que seriam queimadas, eram ensacadas pelo zelador da caixa-forte, no caso o próprio Edilberto. Ele preparou sacos em duplicidade. Naqueles que seriam transportados para o forno, usou a técnica do golpe do conto de vigário, colocou jornais até quase a borda e cobriu com dinheiro verdadeiro. Nos que ele viria buscar mais tarde, os enchia com as notas recolhidas, escolhendo as melhores, contabilizava tudo, já selecionando o que doaria a cada instituição.
Edilberto tinha uma Caravan, caminhoneta grande.
Chegou bem cedo ao banco com seu carro e ele próprio, não queria testemunhas no que faria, pôs sua carga preciosa no porta-bagagem do veículo. Sabedor da rotina dos vigias, calculou para sair logo após a troca da guarda.
Assim foi feito, Edilberto deixou seu carro na garagem de sua casa e regressou ao banco onde esperou a chegada do carro forte. Os sacos restantes abertos, aparentemente cheios com dinheiro foram fechados na presença do inspetor e embarcados para cremação.
As doações se iniciaram lenta e gradualmente
Seu plano corria muito tranquilamente, parecia ser um crime perfeito.
À época, o sistema bancário não era informatizado e nem a Receita Federal controlava depósitos e saques.
Edilberto sempre depositava nas contas das instituições, preservando seu anonimato.
O Destino reservava uma surpresa para Edilberto, a diretora de um orfanato era casada com o gerente do banco de onde vinham as doações. Ficou curiosa em saber quem era o misterioso Mecenas. O marido descobriu que era Edilberto, funcionário do Banco Central. A esposa resolveu agradecer e elogiar o bancário. Escreveu uma carta ao Presidente do banco citando nominalmente Edilberto e a ele tecendo loas.
Seguiu-se uma sindicância em caráter confidencial, uma contabilização rigorosa foi realizada em todas as caixas fortes; o resultado não mostrava desvio de dinheiro.
Edilberto passou a ser vigiado por agentes do banco, foi detido e levado à presença da Diretoria. Confessou o que vinha fazendo. Parte da quantia foi recuperada e dessa vez realmente incinerada.
O Banco Central ocultou o acontecido.
Edilberto foi devolvido ao Banco do Brasil e movimentado para uma agência em Tabatinga no Amazonas onde vive até hoje.

Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com

domingo, 9 de junho de 2013

CONTOS DO MUNIR 007-2013



MENINICES

DISNEY WORLD 2010
Luiza
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Elevador que Cai
 Luiza tem seis anos. É lourinha, os dentinhos da frente já caíram, está junto da mãe na entrada do Castelo. As luzes piscam, apagam-se por alguns segundos. Luiza tem medo. Um holograma mostra um fantasma. A música é fúnebre. Entram no elevador. A porta do elevador se abre e, nos andares, mais fantasmas aparecem. Luiza se agarra à mãe. O elevador sobe mais ainda, para no último andar. Dá para ver a altura em que está por um vidro; lá em baixo, as pessoas parecem pequenas.
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O elevador começa a descer normalmente, um estrondo e começa a cair vertiginosamente.
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Luiza grita: Mamãe! Será que a gente vai sair vivo daqui?
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Ainda assustada, Luiza e a mãe saem do elevador, estavam com fome, estimuladas pelo medo- comer lhes daria a coragem perdida.
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A mãe de Luiza pediu uma pizza de mussarela e rúcula fresquinha. Luiza ao ver a pizza disse:
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-Mamãe! O meu cocô vai ficar verde!

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Helena
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Helena tem três anos. Estava com os pais em um apartamento de um hotel da Disney. Seu avô estava em um quarto no mesmo corredor. Bem cedinho, aproveitando a porta aberta Helena, saiu correndo e bateu no apartamento do vovô.
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-Vovô, eu fiz cocô!
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Deitou-se na cama e começou a tirar a fralda.
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Era muito.
E ela:
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-Olha o meu cocô!
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Alegre, rindo, toda ensopada, o perfume se espalhando.
Gritava radiante:
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-É o cocô da Helena, o meu cocô!
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Por sorte, a faxineira do hotel estava fazendo a limpeza e a fralda foi devidamente descartada.
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Deu muito trabalho, uso de muito detergente, portas e janelas abertas até que o ambiente se tornasse respirável

SHOPPING LEBLON 2013
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Três meninos e uma menina, dois deles mais crescidinhos, a menina e o outro um pouco menores. Estavam em frente à Livraria Travessa. Duas poltronas vagas- o menino menor, Pedro, arremessou sua mochila em uma delas para garantir o lugar, a garota, Marta, fez o mesmo com sua bolsa. Os dois garotos maiores, Marcelo e Carlos Alberto, não deram bola, tiraram a mochila e a bolsa e sentaram.
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Marta chamou o amiguinho que ficara de pé e começou a cochichar no ouvido dele, despertou a curiosidade dos outros dois. Pedro falou para ser escutado:
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-Oba! Vamos sim e começaram a caminhar, a garota liderando.
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Foi o suficiente para que Marcelo e Bebeto se levantassem e passassem a seguir a guria.
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Pedro deu a volta rápido, sentou-se, Marta fez o mesmo.
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Os taludinhos se renderam a astúcia.
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TIJUCA CASA DE VILA
Pedro e Zeca
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Pedro tem oito anos, tinha acabado de brigar com o Zeca, irmão do Bituta, logo fizeram as pazes. Dona Carmem, mãe do Zeca soube da briga, mãe é mãe... Achou que o Pedro era o culpado.
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Dona Carmem, falando de forma não preconceituosa, tem seu IMC* bastante elevado na relação ideal de peso-altura. Só usa vestido tipo camisolão, é muito branca, usa um batom vermelho forte e mesmo em casa põe sombras nos olhos. A gente fica em dúvida se é mesmo pintura ou natural. Dona Carmem é viúva, corre boato de que tenha despachado o marido, depois que soube que ele a traia.
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O Zeca chamou o Pedro para ir a sua casa, iam pegar bolas de gude, Zeca foi até o quarto procurar, jogariam na rua da vila, onde o Zeca morava.
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Pedro ficou sozinho na sala. Dona Carmem ouviu que tinha alguém e saiu da cozinha para olhar. Viu Pedro, com a mão direita nas costas, pegou com a esquerda uns biscoitos em um pote.  
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Falou:
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Pedro, esses biscoitos são uma delícia, você não quer?
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Dona Carmem estava com um camisolão vermelho. Pedro viu pelo espelho da cristaleira o facão de cortar carne.
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Apavorado, cruzou os braços abaixo do estômago, deu meia volta e saiu correndo para a rua.
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Dona Carmem ainda o chamou, mas Pedro já estava longe.
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Desde então, mesmo adulto, Pedro ainda sente um frio percorrer sua vertebral, quando cruza com uma mulher de IMC muito elevado e de vestido camisolão; se for vermelho, então...
*Índice de Massa Corporal.
Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com