segunda-feira, 28 de abril de 2014

CONTOS DO MUNIR 006/2014

RELATOS

Abril 2014 sexta-feira Armazém do Café.

Já estávamos ali há algum tempo. A moça de shortinho preto vem em nossa direção, traz um presente. Nós já a conhecíamos, o presente é um livro que mostra a saga de sua família, dá o livro para meu amigo que busca nele pessoas conhecidas. A moça é...Walquiria

Walquiria é uma mulher atraente física e intelectualmente. Seu porte é ereto, anda como uma modelo que vai entrar na passarela. No outro dia, apareceu com uma discreta rosa no cabelo. Seus olhos são esverdeados, revelando um ramo nórdico de origem. Com surpresa para nós, revelou que uma de suas bisavós era índia nascida em Mato Grosso. A família de Walquiria é de Pernambuco. Ela conta:

-Minha bisavó era natural de um povo indígena, chamado Tapirapé, seu nome original na tribo era Raira, não sei como foi parar em Recife, sei que ela falava Tupi Guarani e dizem que quando estava zangada com meu bisavô, deixava o português e o xingava em sua língua natal. Em Pernambuco foi batizada com o nome de Eva.

Walquiria continua:

-Eu tinha dois anos quando meu bisavô morreu e pode parecer mentira, mas lembro dele, era um homem alto e forte, essa é a imagem que tenho dele. A bisavó Eva teve vinte e quatro filhos. Mamãe conta que ela sempre grávida subia ágil nos coqueiros se agarrando com mãos e pés, com a faca na boca. Meu bisavô tinha outros filhos fora da sua união com a bisa, segundo minha avó. Ela disse que certa vez bateram na porta da casa de Eva. Era uma senhora com duas crianças que vinha se queixar que meu bisavô a havia abandonado por outra mulher mais jovem e havia parado de manter a família. A bisa mandou que ela voltasse no dia seguinte. Virou fera, e em mistura de português e tupi intimou seu Gumercindo, esse era o nome de meu bisavô, a continuar a prover a família. Assim foi feito.

Walquiria diz que quer contar outra história. Pergunta:

-Sabe aquele truque que os mágicos fazem de puxar uma toalha da mesa cheia de pratos e copos e eles puxam a toalha e fica tudo no mesmo lugar? Pois é, a minha avó contava que sua mãe deu uma de mágico, só que ela não era. Naquele tempo, a louça era toda importada, custava caro. Estavam todos na hora do almoço. A mesa enorme para caber tantos, era maior que a mesa comunitária da padaria “O Padeiro de Sevilha” em Florianópolis. Uma peça única de mogno com quase vinte metros de comprimento. A comida era galinha ao molho pardo. Mais de duas dezenas de pratos e copos, alem das travessas. Pois não é que Seu Gumercindo cismou de reclamar que o molho estava sem sal! A dona Eva nem pestanejou, puxou a toalha e veio tudo ao chão. Minha avó disse que desde aquele dia o meu bisavô nunca mais reclamou de nada.

Walquiria deixou seu livro e seguiu caminhando rumo à praia, fazendo a Rua Rita Ludolf parecer uma passarela. Ficamos ali, ansiosos por ouvir seus novos relatos. 

Autor: Munir Alzuguir

E-Mail: alzumunir@gmail.com

quarta-feira, 23 de abril de 2014

CONTOS DO MUNIR 006/2014


RELATOS

Abril 2014 sexta-feira Armazém do Café.

Já estávamos ali há algum tempo. A moça de shortinho preto vem em nossa direção, traz um presente. Nós já a conhecíamos, o presente é um livro que mostra a saga de sua família, dá o livro para meu amigo que busca nele pessoas conhecidas. A moça é...

Walquiria

Walquiria é uma mulher atraente física e intelectualmente. Seu porte é ereto, anda como uma modelo que vai entrar na passarela. No outro dia, apareceu com uma discreta rosa no cabelo. Seus olhos são esverdeados, revelando um ramo nórdico de origem. Com surpresa para nós, revelou que uma de suas bisavós era índia nascida em Mato Grosso. A família de Walquiria é de Pernambuco. Ela conta:

-Minha bisavó era natural de um povo indígena, chamado Tapirapé, seu nome original na tribo era Raira, não sei como foi parar em Recife, sei que ela falava Tupi Guarani e dizem que quando estava zangada com meu bisavô, deixava o português e o xingava em sua língua natal. Em Pernambuco foi batizada com o nome de Eva.

Walquiria continua:

-Eu tinha dois anos quando meu bisavô morreu e pode parecer mentira, mas lembro dele, era um homem alto e forte, essa é a imagem que tenho dele. A bisavó Eva teve vinte e quatro filhos. Mamãe conta que ela sempre grávida subia ágil nos coqueiros se agarrando com mãos e pés, com a faca na boca. Meu bisavô tinha outros filhos fora da sua união com a bisa, segundo minha avó. Ela disse que certa vez bateram na porta da casa de Eva. Era uma senhora com duas crianças que vinha se queixar que meu bisavô a havia abandonado por outra mulher mais jovem e havia parado de manter a família. A bisa mandou que ela voltasse no dia seguinte. Virou fera, e em mistura de português e tupi intimou seu Gumercindo, esse era o nome de meu bisavô, a continuar a prover a família. Assim foi feito.

Walquiria diz que quer contar outra história. Pergunta:

-Sabe aquele truque que os mágicos fazem de puxar uma toalha da mesa cheia de pratos e copos e eles puxam a toalha e fica tudo no mesmo lugar? Pois é, a minha avó contava que sua mãe deu uma de mágico, só que ela não era. Naquele tempo, a louça era toda importada, custava caro. Estavam todos na hora do almoço. A mesa enorme para caber tantos, era maior que a mesa comunitária da padaria “O Padeiro de Sevilha” em Florianópolis. Uma peça única de mogno com quase vinte metros de comprimento. A comida era galinha ao molho pardo. Mais de duas dezenas de pratos e copos, alem das travessas. Pois não é que Seu Gumercindo cismou de reclamar que o molho estava sem sal! A dona Eva nem pestanejou, puxou a toalha e veio tudo ao chão. Minha avó disse que desde aquele dia o meu bisavô nunca mais reclamou de nada.

Walquiria deixou seu livro e seguiu caminhando rumo à praia, fazendo a Rua Rita Ludolf parecer uma passarela. Ficamos ali, ansiosos por ouvir seus novos relatos. 

Autor: Munir Alzuguir

E-Mail: alzumunir@gmail.com

terça-feira, 1 de abril de 2014

CONTOS DO MUNIR 005/2014

PRODUÇÃO INDEPENDENTE
Sábado março de 2014. Armazém do Café.
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Em uma mesa do Armazém, dez e trinta da manhã, lendo o caderno Prosa do jornal O Globo. Via os comentários do livro que o Rodrigo Alzuguir, filho do Ronald meu primo, escrevera sobre o compositor Wilson Batista.
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Chega Fred - meu amigo - pede um chocolate. Na mesa ao lado, a moça morena, descansa em uma cadeira, a perna bem torneada e ligeiramente inchada. Usa minissaia jeans, rosto oval, cabelos pretos cortados à moda Chanel, o que a torna mais atraente, pergunta a Fred se è bom. Fred diz que é muito. Ela quer um chocolate pequeno, mas em uma xícara grande.
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Estávamos nós três. Fred adora um papo; a moça diz que está fora de casa desde cedo.O apartamento, vizinho ao dela, em obras incomoda demais com o barulho. A toda hora liga para a portaria de seu prédio, indaga se já pode voltar. Diante de tantas respostas negativas, resolve ligar para a Polícia.
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Fred indaga como ela se chama.
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-Natasha.
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-Oi Natasha, sou Fred, sou matemático precocemente aposentado- continua Fred
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-Eu ainda trabalho, sou formada em marketing e estou no INPI.   – diz ela.
Xi!-fala Fred- Minha experiência com o INPI não foi legal. Quis registrar a marca da minha empresa e foi difícil.
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Chega outra moça aparentando a idade aproximada de Natasha. Seu perfume J’adore, invade o ambiente,veste uma calça legging preta ajustada ao corpo malhado. É loura de cabelos longos, parece recém-saída de um salão de beleza, olhos azuis brilhantes enfeitam seu rosto A conversa passa a ser entre elas.
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Natasha se esquece de querer voltar para casa.
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Iniciam um papo de viagens e amores frustrados.
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A jovem que chegou, se chama Nicole, estava saindo de um relacionamento. Para desanuviar, fora de surpresa a Paris em busca de um antigo namorado, um ex-colega de mestrado em arquitetura. Conta que não foi muito bom. Ele também estava com outra, apesar de ter trocado mensagens amorosas por emails.
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As duas se perguntam se tem filhos. Ambas as respostas são negativas. Nicole diz que correu um sério risco com o último namorado. Queria muito, depois ficou contente porque o cara se revelou um “porra louca”. Natasha conta que um colega de trabalho no INPI, boa pinta e inteligente, louco por crianças, casado com uma mulher que não poderia ter filhos, perguntou se ela não poderia ser mãe de um filho seu. Seria uma única vez.
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-O Pedro era interessante e tinha boa saúde, eu quase topei. Só não concretizei porque poderia gamar, querer mais e complicar minha vida.-disse Natasha.
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Cheguei a conclusão que não vou esperar mais. Vou partir para a produção independente!-exclamou Nicole.
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Natasha:
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-Como é que é isso?
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-Você tem que procurar um médico especialista. Fazer uma série de exames, depois ele indicará um ou mais bancos de sêmen para escolher o doador- falou Nicole.
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-Como?- Perguntou Natasha.
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-É assim:
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- Você recebe uma lista do banco. Nela constam as informações do doador. Ele não pode ter menos de vinte anos e mais de quarenta, não pode ter tido doenças sexualmente transmissíveis, distúrbios genéticos, psicológicos, tem que ser saudável, declarar a condição civil e religiosa, cor da pele, cor dos olhos e cabelos, estatura, peso, profissão, formação educacional, quociente de inteligência, tipo de sangue enfim uma “catilinária” de ítens que é difícil de assimilar em um só dia.
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Você não imagina como fica difícil de escolher.Tem alguns que até dá vontade de transar com o cara. Acho que vou por ai... Sabe? Eu sou judia. Na primeira lista que vi, apareceu “evangélico”. Dei uma desanimada e fechei a lista.
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As duas continuaram a trocar abobrinhas como se fossem amigas de longa data.
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Ignoraram a mim e ao Fred.
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Trocaram emails e telefones ali na hora e prosseguiram a conversa no celular, por mensagens, acredito de forma mais íntima, pois, deixamos de escutar. Dava para perceber, porque riam muito.
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Foram embora sem antes lançar um olhar de avaliação para nós.
Munir Alzuguir
alzumunir@gmail.com