OLHE AO SEU REDOR
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Vamos
caminhar um pouco pelas ruas do Leblon, prestando atenção às pessoas que cruzam
nosso caminho.
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Comecemos
a caminhada, o homem não tem os dois braços, usa camiseta de manga curta para
mostrar os cotós e agitá-los quando pede a sua esmola, impossível negar.
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Ali, bem
em frente à Livraria Saraiva, está sentado o senhor com seu cigarro entre os
poucos dentes, à sua frente o andador. Está lá todas as noites.
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Mais
adiante, o neto de um grande compositor brasileiro, de andar cambaleante, dois
passos para frente, um para o lado, outro para trás, a fazer malabarismo com um
cigarro. Com a boca joga o cigarro aceso para o alto que gira duas vezes e
volta aos seus lábios.
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Lá vai o
rapaz, completamente cego, com sua bengala tateando o muro do antigo Colégio
Saint Patrick. Quando mocinho ainda enxergava, depois a cegueira veio crescendo
até a escuridão total.
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A moça com
síndrome de Down, bonitinha recolhia os donativos na hora da missa na Igreja
Santa Mônica, ainda faz isso, agora nem se passaram cinco anos, envelheceu,
está de cabelos brancos e perdeu a doçura de seu rosto.
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Andemos um
pouco mais, a negra desmazelada sentada como se fosse cliente no banco de
madeira do Filé do Lira. Antes, vimos o rapaz de classe média, machucou a perna
há alguns anos, a enfaixou, recebeu esmola tão boa, quando sentado na Praça
Antero Quental confundido com um mendigo. Nunca mais tirou as bandagens. Faz
ponto na Bartolomeu Mitre.
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Um
flanelinha ali, com pena de um deficiente, ex-surfista ferroviário atropelado e
mutilado por um trem, divide com ele suas tarefas.
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Um pouco
mais e encontramos o Moacir, corcundinha de rabo de cavalo azul e rosa sentado
no seu skate.
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Vemos o
meu amigo na cadeira de rodas, não era para estar lá. Tinha um aneurisma,
sentia-se bem, os médicos o assustaram ao dizer que poderia se romper e ele
teria morte imediata. Fez a cirurgia, não deu certo, passou muitos dias em
coma, conseguiu se recuperar, mas perdeu quase que totalmente a mobilidade das
pernas. .
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Tem uma
fazenda e muito afeto pela criação de seu gado. Depois de quase dois anos sem
ir lá, alugou um carro com motorista e foi. No curral ele caminhou.
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Comprou um
triciclo elétrico, sorridente vai à Ipanema.
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Outro
amigo também está com aneurisma, diz que não opera, e vai levando. Está assim
há mais de quatro anos.
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Mais dois
outros da turma da Rio Lisboa operaram com sucesso.
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E
reparamos no homem moreno de sunga, não importa se inverno ou verão, de bom
físico, dá uma parada, gira a cabeça em um gesto brusco, depois o corpo,
verifica se alguém o olha. Se sim, fala de forma grosseira, perguntando:
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-O que
está olhando?
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Quase uma
agressão.
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E assim
vamos caminhando pelas ruas do Leblon.
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Vimos
ainda mais algumas cadeiras de rodas, às vezes um monte delas em manhãs de sol.
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Embaixo
das marquises mendigos dormem.
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Se formos
ao Arpoador pela manhã, encontraremos o King, eternamente bêbado, que faz com
sua trupe de pobres parte do visual local.
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Talvez
vejamos o Marcello, emagreceu vinte quilos, para sentar tem que usar almofada,
perdeu quase que totalmente a musculatura dos glúteos, está fazendo quimo. Não
perdeu seu sorriso cativante.
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Finda a
caminhada, pensamos o quanto somos abençoados.
Autor: Munir
Alzuguir
E-Mail:
alzumunir@gmail.com
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