segunda-feira, 27 de outubro de 2014

CONTOS DO MUNIR 015/2004



CARIDADE e DESMAIOS
A mensagem dizia:- Estamos no Fronteira comemorando o aniversário da Cellya, aguardamos você.
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Tinha acabado a sessão de cinema, um filme longo, quase três horas, o celular desligado.
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Olhei a hora do SMS, uma hora atrás. Liguei, estavam já na sobremesa. Eu no Shopping Leblon, eram já nove horas da noite, pensei que daria tempo, se me apressasse, de chegar e encontrar a turma toda reunida. O Fronteira fica a poucas quadras. Caminhei rápido até lá. Queria dar um abraço na Cellya.
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Estavam todos em uma grande mesa nos fundos do salão. Notei a movimentação diferente, o marido de Cellya correndo para a rua, a mãe dela, muito pálida, quase deitada em um sofá.
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Tinham já ligado para a ambulância, que não chegava, e alguém saíra para pegar um taxi. A senhora foi carregada e levada ao hospital.
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Cellya e o marido a acompanharam.
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Não tive oportunidade de cumprimentar a aniversariante. Pensei em comer alguma coisa, como era tarde, não queria jantar. O Alemão é um restaurante vizinho ao Fronteira, lá tem um Mil Folhas, um  folheado delicioso, com muito açúcar e que equivale a uma refeição. Melhor dizer, tinha, quando cheguei havia acabado, o que mais aumentou a minha vontade de comê-lo. Bem perto, uma confeitaria, a Pavelka, faz na hora. Pedi que embalassem, iria comer em casa.
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Ansioso já sentindo o prazer de degustá-lo, apressei o passo. Ao passar em frente a uma loja de roupas, um mendigo de avançada idade, ao me ver com a embalagem, pensando que fosse uma quentinha exclamou:
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-Senhor! Dá essa comida para mim! Estou com muita fome!
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Segui o meu caminho dizendo:- Não é quentinha, é doce! O pobre insistiu:- Moço me dá, estou sem comer desde ontem!
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A dúvida me assaltou, uma culpa, não sei de quê, me fez voltar e dar para ele o mil folhas. Ele agarrou o doce com sofreguidão e praticamente o deglutiu na mesma hora. Sua cabeça pendeu para um lado, seu corpo desabou na cadeira, onde estava sentado, pensei que era um AVC.
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Como já tivera anteriormente uma experiência com a doméstica da minha casa, disquei 192, o telefone da SAMU. Em menos de cinco minutos a ambulância chegou e, ao homem de branco eu disse o que tinha acontecido.
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Sem demora, ele aplicou uma injeção no idoso, que quase imediatamente voltou ao normal. Ai foi a minha vez de saber o que havia se passado. O paramédico explicou:- Ele é diabético e teve uma crise de hipoglicemia, o que fiz foi injetar insulina, e a dosagem de açúcar se normalizou.
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No dia seguinte, fui ao médico pedir um exame de sangue. Prometi nunca mais dar doce ou qualquer espécie de alimento para mendigos. Fiquei imaginando se desse um salgado para um  de pressão alta e, o cara enfartasse?
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A mãe da Cellya se recuperou e passa bem, foi só um problema de pressão baixa.
Autor: Munir Alzuguir
E-Mail: alzumunir@gmail.com

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