Munir cedeu seu espaço para esta crônica de sua amiga Magda.
DESACELERE
PRA CHEGAR LÁ...
.
Se não desligar-se, não
entre. Deixe celulares, ipods, tablets, razão e mente do lado de fora – ou,
melhor, em casa. E permita-se uma experiência sensorial, nu, mas levando só a
alma junto, no máximo o coração a tiracolo dela. E adentre a sala escura...
.
Se não fizer isso, com certeza o verei – perplexa –
retirar-se porta a fora, no máximo em 30 minutos, indignado e de mau humor...
.
E assim foi, assim é. Se possível fosse, Malick se absteria
do fotograma e jogaria direto na tela as emoções humanas: pláft! Mas ele ainda
usa o fotograma e um genial parceiro de fotografia, que consegue expressar tudo
que o mago do cinema contemporâneo concebe pra nos tirar da zona de conforto.
Filósofo, metafísico, místico que passeia por realidades paralelas sem ser
nenhum Chico Xavier, o criador de To the
Wonder nos leva ao quântico de nossa condição humana, sem tecnologia
especial, apenas usando o fio da navalha do que temos de mais básico na
expressão terrena: um homem, uma mulher. A possibilidade infinita do encontro;
a trivialidade mais consequente da discórdia.
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Quase cinema mudo, não fosse pela trilha que nos incendeia
inteiros e uma palavra ou outra nunca desperdiçada, o diretor é gênio ao
esgrimir a imagem, seja da natureza, seja das criaturas: cada olhar e cada
flor, cada gesto ou luz e sombra, o movimento em dança que inunda a tela de
felicidade, ou o silêncio contido que nos faz quase gritar no lugar do
protagonista – vai, por favor, vá... não deixe que se escoe este sagrado
instante, esta plena chance de ser feliz! Tudo isso sem palavras, sem o verbo,
sustentado só na cena permeável aos sentimentos, poros abertos a respirar com a
gente. E quando a palavra vem, ela chega a reboque dessa imagem explícita,
apenas completando o quadro. Sutil e quase dispensável. Quase. Porque nada
sobra e nada falta, cinema em sua mais pura expressão: emocionante se entregar,
sem resistência, à experiência de um filme de Terrence Malick.
.
Tão
genial este diretor consegue ser, que ao escolher seus protagonistas ele traz
um Ben Affleck bem certinho no papel que mais lhe cabe, e Olga Kurylenko no
feminino frágil que se fragmenta, ao colocar no outro a plena força que só a si
cabe como mulher que é. O padre vivido por Javier Bardem também procura fora o
sagrado que lhe falta dentro e, assim, todos os gestos de amor ao próximo nos
chegam vazios, quase profanos. O Amor
Pleno, do título em português, só é possível naquele espaço interno que nos
é peculiar em alguns instantes, entre a célula e o cósmico da nossa infinitude:
uma meditação. No filme, apenas um lugar comum: todos procuram fora o que só pode
ser pleno nesse sagrado de cada um. Ao chegar ali, mesmo que por um breve
instante, nos deslumbramos com um amor possível que não depende de ninguém e de
nada mais – partilhável e autossustentável.
.
The
End: quando sair do cinema, se dê uma chance maior ainda – o silêncio. Será a
maior homenagem que fará a Malick. Lembrando Osho, tome uma xícara de chá ou um
proseco ali na esquina de um lugarzinho bom. Se estiver acompanhado, apenas
brinde olhando fundo no olhar de alguém, sem o verbo atrapalhando o quadro e
permitindo um espaço-tempo vir à cena. Ali, talvez brote outra essência diferente
das letrinhas que você leu aqui: deixe... talvez surpresas venham à tona. Se
sair falando e interpretando tudo, ouvindo e reagindo a cada palavra do outro
que com você está, esse mágico ponto vai se perder e o mental de novo sobressair,
fazendo deste só mais um filme que a razão adora polemizar. Tim-tim...
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