sábado, 8 de agosto de 2009

CONTOS DO MUNIR - 3

HISTÓRIAS DE PESCADOR

Março de 2001- Conceição da Barra Espírito Santo


Desde algum tempo o mar avança sobre a cidade.
A erosão, no bairro Bugia, alargou as margens do rio Cricaré e no crescente de sua boca o mar devorou quase todas as casas dos pescadores, algumas casas de veraneio e os quiosques ali próximos.

O farol, de mais de 50 anos, ameaçado, deixou de ser referência para os navegantes e foi mudado para uma praça no centro da cidade. Passou a ser monumento.

As marés de lua cheia de março elevam o nível das águas a quase dois metros. As barricadas de sacos de areia e postes de eucalipto pouco adiantam.

Hoje não mais que oito ou dez famílias de pescadores ainda resistem à mudança da Bugia para locais mais seguros.

O Prefeito decretou situação de emergência e acionou a Defesa Civil.

Conceição da Barra é um balneário muito procurado por turistas, do próprio Estado, de Minas Gerais e do Rio de Janeiro. Muitos têm residências de verão a beira-mar. Por medo de que o mar continue a progredir sobre a cidade, e mais a perturbação causada por ambulantes que um mês antes do carnaval se instalam em frente às varandas, cortando a vista e o sossego, proprietários anunciam suas casas para venda sem resultado.

A história que vamos contar foi relatada por um pescador e aconteceu em um sábado, logo depois do carnaval, quando a cidade e as praias ficam desertas.

Estávamos caminhando pela praia, vimos um barco chegando na arrebentação, tão carregado de peixes que quase não havia lugar para os quatro pescadores tripulantes.

Admirados de tanta fartura, perguntamos se era sempre assim.

Um dos pescadores, creio que o mais jovem, nos disse que não, e que, além do infortúnio do mar a invadir suas casas , agora estava a lhes negar o sustento.

Haviam saído, como de hábito, ao nascer do sol e depois de quatro horas, regressaram à praia para desembaraçar e limpar as redes, sem um único peixe.

Desanimados, pensaram em desistir e recolhiam as redes. Então, passou por eles um turista de cabelos longos e arruivados, com um chapéu esquisito, óculos mais esquisitos ainda, um tipo bem "hippye", alto, magro e que disse para eles:


-Não sou Jesus, mas, se vocês continuarem a pescar, vai ter muito peixe.

O pescador terminou sua história e perguntou se eu não havia visto o tal camarada.
Poderia parecer que a história terminaria assim, não fosse o fato do turista ser, na verdade, um biólogo, natural do Espírito Santo, realizando a parte prática de seu doutorado de biologia marinha, em um navio de pesquisa norueguês.

Na passagem do navio pelo litoral do Brasil detectaram com seu poderoso sonar um grande cardume, fora dos padrões normais e que se dirigia para a região de Conceição da Barra.

Foi quando o nosso capixaba pediu ao Comandante que o helicóptero de bordo o deixasse em terra por uma noite...

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