sábado, 21 de novembro de 2009

CONTOS DO MUNIR - 18

FANTASIA

RR, meu companheiro, senta-se comigo aos domingos no calçadão da praia do Leblon. Eu leio o jornal, e ele fica ali contando suas histórias. Como RR gosta de monologar, não se importa muito se eu não o estiver escutando. Mas dessa vez, o contar era diferente e parei de ler. RR estava apaixonado. Um parêntese: RR e eu já temos carteirinha de idosos, não que isso seja relevante, importante é que o objeto de desejo de RR é uma jovem atriz do cinema espanhol e RR está livre para se apaixonar. É divorciado há mais de três anos. Tem a cabeça branca, três pontes de safena e um implante de "stent", usa sunga e óculos escuros de garotão.


Ele me conta que foi ao cinema e assistiu ao filme onde a moça era a heroína. Por uma dessas coincidências ao procurar em Ipanema em uma vídeo-locadora outro filme com a mesma artista, viu uma morena com um vestido pretinho básico examinando um DVD com um rosto de mulher em sua capa e percebeu que era a sua musa. RR achou que aquele era o “sinal”.

RR, bem apessoado tem um belo sorriso, veste-se com elegância é engenheiro e piloto civil, cursou em parte a Escola de Aeronáutica foi diretor de uma grande empresa de engenharia na Europa e Japão e, portanto, viajado.

Aposentou-se em ambas as profissões.


Como RR fala espanhol, inglês e francês, a moça aceitou a abordagem e ficaram ali conversando por algum tempo, só que RR perguntou tudo menos em que hotel ela estava.
À noite em casa lembrou-se de no dia seguinte ir procurar, nos hotéis próximos, onde estaria o grupo de espanhóis que viera ao Rio para o lançamento do filme onde ela era a artista principal.
RR achou o hotel, mas para sua decepção a comitiva já havia partido de regresso a Barcelona naquela madrugada.
O “sinal” não abandonou RR: no mesmo dia, sua sobrinha levou para casa o DVD que ele havia visto nas mãos da morena.
RR não entende de internet e nem tem computador; às vezes eu comentava com ele que praticamente encontrava quase tudo através de programas de buscas.


RR achou em Ipanema uma loja que alugava computadores, a princípio ficou meio inibido de falar com o rapaz encarregado o que desejava, mas sua vontade de saber mais sobre a moça era forte, e acabou por descobrir com a ajuda do empregado da loja o site da artista.

Havia mesmo um fã-clube em que RR se inscreveu.

Passou a freqüentar diariamente a página na internet. Ao final de alguns dias, já sabendo muito da carreira da estrela, estava mais apaixonado ainda. Mandou imprimir uma linda fotografia da artista, emoldurou e pendurou na parede de seu quarto.
Queria muito conversar com sua musa e acreditava que certamente ela se lembraria dele, (“o rapaz da vídeo - locadora”). Mandar um e-mail para o clube, ele achava não só vulgar, mas difícil de chegar às suas mãos.
Pediu pela internet o endereço, mas foi informado que por razões de segurança, nem o telefone poderia ser divulgado.

Esse assunto prolongou-se por vários domingos e RR tornava-se quase que obsessivo: já havia descoberto a data do aniversário de sua deusa; que estava indicada para o prêmio correspondente ao Oscar na Espanha; que estavam programados mais dois filmes para os próximos anos e outros detalhes.

Quando perguntei se estava apaixonado a resposta foi mais ou menos assim: você acha que eu deveria me apaixonar pelo Michael?
No último domingo me contou que agora jogava um real toda semana na mega-sena. Tinha certeza que ganharia e iria a Barcelona convidá-la para jantar.

Acho que vou fazer o mesmo e se ganhar vou convidar a marciana dos meus sonhos.

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