terça-feira, 16 de novembro de 2010

CONTOS DO MUNIR 53

A CARTA
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Mario olhou com surpresa a carta, não acreditou que fosse de Luiza. Fazia tanto tempo...
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Mas, a letra, dela, não tinha dúvidas.
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Foi conferir antes de abrir: O bilhete guardado, ainda estava lá, na primeira gaveta do armário, que antes dividia com ela. Era quase que uma obrigação lê-lo. O par de meias, todas as manhãs, passava pelo filtro do papel do aviso que Luiza deixara e que já começava a desbotar. Pensou mais uma vez: Estaria ele também envelhecendo e daí o abandono?
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Não se considerava assim, nem por vaidade. Era obrigado pela Companhia onde trabalhava, a testes físicos e de aperfeiçoamento intelectual, os resultados lhe davam sempre o grau de excelência.
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O texto do recado era curto e cruel, mas deixava uma esperança. Dizia escrito, com a caneta esferográfica encontrada ao seu lado:- “Desculpe. Cansei. Fui. Até breve”
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A princípio, Mario pensou tratar-se de uma brincadeira, principalmente por Luiza ter usado de uma modernidade de gíria que ela detestava.
Caiu na realidade, ao ver o guarda-roupa vazio.
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Decidiu, apesar de sua ansiedade, não abrir a carta imediatamente. Examinou o envelope:- brasileiro, selos americanos, pelo carimbo quase apagado, não dava para dizer onde tinha sido postado, a data era de cinco dias atrás.
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Talvez a carta explicasse o “porquê” que tanto o atormentava; mesmo assim se conteve e optou por ler só no dia seguinte. Tentou dormir, apesar do “Rivotril”, o sono não chegava. A inquietude o levou a abrir o envelope, retirou as duas fotos, ao vê-las, parecia que um relâmpago iluminava seu cérebro.
Começou a ler:
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Mario,
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Você já deve ter visto as fotos, uma é sua, a outra de nosso filho que tem agora a mesma idade. Não fosse por pequeninos detalhes, a gente poderia afirmar que era o mesmo menino.
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Você não pode imaginar como foi difícil a minha decisão, mas ela foi tomada tempos atrás, desde o dia em que fomos à clínica.
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Chorei muito, escondida no banheiro, quando você estava em casa, ou no quarto, quando você saia para o trabalho. Jurei que nunca mais repetiria o que fiz.
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Nunca deixei de amá-lo, mas quando soube do resultado do exame, percebi que novamente seria persuadida, então, fiquei sem alternativas.
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Hoje, ainda sinto muito a sua falta, mas procuro superá-la, passando as horas com esse meu jovem companheiro; nós ficamos muito tristes quando ele pergunta pelo pai.
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Luiza

Mario, agora soluçava, as lágrimas não contidas choravam a dupla perda.
Contemplou novamente as fotos, a semelhança era realmente extraordinária. Achou os dois meninos lindos e notou que seu filho usava uma jaqueta de colégio onde se lia “Burning Tree Elementary School”.
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Sem demora, Mario embarcava em um vôo no Aeroporto Internacional do Galeão. Seu destino: Washington D.C., Maryland Bethesda, Burning Tree Elementary School.
Autor: Munir Alzuguir

E-Mail:alzumunir@gmail.com

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