segunda-feira, 9 de maio de 2011

CONTOS DO MUNIR - 63

O TEMPO E PESSOAS
Parte 2-23/04/2011
EDUARDA

Eduarda é linda. Olhos negros, enormes, o nariz afilado por natureza o que nenhuma cirurgia plástica seria capaz de imitar, cabelos longos também escuros que ela ainda escurecia mais. Pernas longas, as coxas realçadas pelo biquíni. Atraia a atenção na praia, corpo de modelo, mas não anoréxico, curvas definidas, porte esbelto. A tez, de uma italiana do campo, dourada pelo sol do Leblon.
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Casada, tem trinta e cinco anos, três filhos: o mais velho, um menino de doze anos, depois uma menina de dez e outro menino de cinco. Está sempre na praia em frente ao Hotel Marina no Leblon, na rua onde mora. Fiel ao marido, não olha para ninguém. Ela mesma, não sabe o porquê, começou a prestar atenção ao jovem recrutado pelo exército que passava com sua farda de soldadinho, cabeça quase totalmente raspada. Antes usava o corte, ou melhor, o não corte dos meninos de dezoito anos. Era assim que Eduarda costumava vê-lo.
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O rapazinho tinha olhos claros, refletiam brilhando pelo uniforme e gorro verde oliva.
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Transformaram o olhar de Eduarda, passou a ver nele um homem, daí nutrindo uma paixão inexplicável pelo garoto, acordando nela um desejo de sexo que ela já não mais desfrutava com o marido.
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A principio tentou reagir, o mirar do rapaz respondia ao seu.
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Certo dia, ao voltar do colégio onde deixara os filhos, se encontraram, e ela, tomada por um impulso, o chamou para sua casa e uma rotina de amor e sexo ficou definida. Foi seu primeiro amante. Outros, ao mesmo tempo ou não, se sucederam, o sexo despertado tornou-se uma obsessão. O piloto da Varig, casado, fazia uma escala alternativa ao passar de carro pela sua casa. O rapaz rico do Maranhão, que vinha ao Rio tratar de seus negócios, passou a fazer parte do seu círculo amoroso.
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Católica, frequentava a igreja aos domingos, sempre confessava, fazia sua penitência, não resistia às tentações.
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O padre que a atendia foi transferido à outra paróquia. O substituto, rigoroso, negou-lhe a absolvição, proibindo-a de comungar.
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Eduarda passou a viver em um estresse permanente, nada a acalmava, vivia insatisfeita, nem o sexo lhe dava alegrias, buscou refúgio no fumo. O Convento de Santo Antonio era agora sua igreja, era seu momento de paz, mas na saída se encontrava com um de seus namorados e seguia para o motel.
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Primeiro cenário:Trinta anos mais tarde...
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O fumo alterara suas feições, o rosto suave estava agora sulcado de rugas, respirava com dificuldade, teve um princípio de AVC e o antigo porte ereto, elegante já não mais se sustentava, uma acentuada perda capilar podia ser notada, apesar de toda tinta negra usada.
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Enviuvara há alguns anos e teve que dividir, em juízo, a pensão do marido, que já não era grande coisa, com a amante dele.
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O soldadinho havia arranjado uma namoradinha e passou a chamá-la de tia (ninguém merece)
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O piloto da Varig, que a vinha ajudando a pagar o condomínio, com a falência da Companhia, perdera a pensão da Aerus e não mais contribuía.
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O empresário do Maranhão se candidatara a deputado e, mesmo tendo empenhado quase a totalidade de sua fortuna, perdera as eleições e não viajara mais para o Rio.
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Desencantada com a religião não frequentava mais a igreja.
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A filha que não gostava de trabalhar tentou, sem sucesso, chantagear os antigos amantes da mãe.

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A diversão de Eduarda passou a ser o Mac’donalds comer hambúrguer.
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Segundo cenário:Trinta anos mais tarde...
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Eduarda parara de fumar desde a volta de seu antigo confessor. Passara a comungar, uma paz extrema começara a envolvê-la. O sexo, já há muito deixara de ser a coisa mais importante de sua vida. Tornara-se fiel. No Convento de Santo Antonio, rezava pela tranquilidade de seu casamento, estava sendo atendida. O marido passara a buscá-la quando saia do trabalho.
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Os anos passaram e ela, nunca deixando de ser ela mesma, conservava sua beleza apesar do tempo inexorável. A suavidade e a tez de sua pele pouco se alteraram. O marido falecera e lhe deixara um seguro e uma pensão que lhe proporcionavam uma vida confortável. Praticava Pilates três vezes por semana que se espelhava em sua elegância e porte de manequim, apesar de contar com mais de sessenta anos. Era tão paquerada quanto às outras de trinta.
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Eduarda já era avó coruja de duas meninas e um menino, para quem dirigia seu afeto.
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O empresário do Maranhão, depois de perder as eleições entregara-se as drogas cometendo um suicídio lento, mas eficaz.
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O ex-soldadinho seguira carreira no Exército, era major, havia se casado e a convidara para madrinha de seu casamento, depois de seus filhos e nutria por ela uma grande amizade e consideração.
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O antigo comandante da Varig passara para a TAP, onde continuou sua vida de piloto, voltara ao Brasil já viúvo e por um desses arranjos do destino matriculou-se na mesma academia de ginástica.
Autor: Munir Alzuguir
E-Mail:alzumunir@gmail.com

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