sexta-feira, 21 de agosto de 2009

CONTOS DO MUNIR - 5

O COMANDANTE E O LIVREIRO DO SEBO
O comandante é submarinista, apaixonado por livros. Hoje, além de reformado pela Marinha, está aposentado depois de muito trabalhar na vida civil. Foi jornalista, diretor de um jornal de grande circulação no Rio e no Brasil, diretor de hospital, escritor, correspondente no estrangeiro e ainda tocava seu piano de cauda. Ao sair da casa grande, em que morava no Humaitá, não pôde carregar seu piano de cauda. Na sala do apartamento, em Ipanema, para onde mudara, ele não cabia. Há muito buscava por um livro cuja edição se esgotara. Alguém sugeriu um determinado sebo. O sebo fica na rua Ramalho Ortigão, no centro da cidade. É uma rua cheia de antigos sobrados do início do século passado. O livreiro mora lá e o sebo está no segundo andar. Sobe-se por uma escadaria de peroba do campo, que resiste bravamente ao ataque de cupins. De corrimão, um tubo de cobre azinhavrado nas junções, por ser utilizado, também, como canalização de água para o andar debaixo, criação engenhosa do construtor português.Na sala espaçosa, montes de livros em todos os cantos, empoeirados e sem nenhuma ordem. O computador ainda vai levar anos para chegar até lá. O livreiro, senhor de meia idade, usando óculos à Gepeto, (o pai doPinóquio), vive em um quarto nos fundos. Nem precisa de campainha, o barulho da escada anuncia o visitante. Indagou do nosso comandante o que ele desejava, não sem antes dizer que já estava no ramo desde criança. O ponto pertencera a seu pai. Disse ter o exemplar que ele estava procurando e estar pronto a vendê-lo, mas teria de fazer um registro em livro próprio. Escreveu em uma agenda, bem antiga e com muitas anotações, o nome do comandante, o endereço, telefone, idade indagando se era casado. Aí, nosso submarinista já começou a achar estranho e mais se admirou quando o livreiro perguntou o nome da esposa, dos filhos e de dois amigos. Não se contendo, o comandante pediu explicação para tanto questionamento.
-“Para que toda essa inquirição?? ”
O livreiro explicou:
- "Era a maneira prática de manter o seu estoque de livros sem precisar empregar muito capital. Acompanhava pelo obituáriodos jornais o falecimento de seus clientes. Esperava pela missa de sétimo dia, - (ele procurava ver o anúncio) - e, depois de algumtempo, se apresentava à viúva dizendo saber que o marido tinha muitosl ivros bem usados. Se ela não gostaria de se ver livre daquela velharia. Normalmente, comprava-os todos por uma ninharia. Seguia o exemplo do pai." A presente história foi contada e vivida pelo recentemente falecido Comandante Liwall Sales, grande oficial de marinha, em um almoço de ex-combatentes no Clube Naval (Piraque) e foi escrita após ser submetida a sua aprovação. Na realidade o autor do conto é o próprio Comandante Liwall.

Um comentário:

  1. Munir, conheci o Comandante Lywall Sales como diretor do "Jornal do Brasil". grnde amigo, alias mais amigo do meu pai que me apresentou.Eram muto amigos, talvez pela aproximação com a literatura e livros.
    Bela lembrança de uma grande figura!
    Paulo Adolfo Aizen

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