sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

CONTOS DO MUNIR - 22

CONTO DE NATAL: "O PRESENTE"

Carlos Augusto completa hoje, dia 22 de dezembro, 46 anos, é submarinista e tem orgulho do submarino que comanda. Estava de regresso à Base no Rio de Janeiro, após a missão de trinta dias, o submarino já na superfície.
Nas proximidades do Natal, as recordações do seu tempo de criança afloram mais fortemente e sempre agradece a Deus e a um tio o melhor presente que recebeu quando menino.


A cena continuamente retorna à sua memória:
A árvore de Natal na sala do apartamento em Brasília, seus enfeites azuis, vermelhos, prateados, as luzes também em cores num piscar que o fascinava.
Outra lembrança o fez sorrir e intrometeu-se em seus pensamentos: naquele tempo não gostava de seu aniversário tão próximo do Natal, era argumento de que seu presente seria melhorado no dia 25. Ainda bem que nem todos pensavam assim, e talvez esta a razão de ter recebido a dádiva que mudou sua vida.

Transportou-se novamente à Brasília, a maior parte da família reunida no apartamento onde moravam, por ser do Banco Central era o mais espaçoso.
Era Natal, não se poupava energia, os blocos e os edifícios se acendiam e seu reflexo iluminava o céu. Era um clarão, avistado ao longe, para guiar quem chegasse de avião ou de carro.
Lembrou-se de algo na árvore que em outras ocasiões não lhe ocorrera, uma coroa dourada adornando o topo, era ele quem normalmente chamava a atenção para o detalhe quando não a colocavam. Ao pé da arvore os pacotes: azuis para meninos, rosas para as meninas. Às vezes embrulhavam errado e a gozação era geral.
Muito se emocionava ao recordar das duas caixas azuis com seu nome. Uma dizia: aniversário, a outra: Natal. Seu tio Alfredo, oficial de marinha e de quem ele tanto gostava, as havia trazido recentemente dos Estados Unidos;
A caixa maior continha uma máquina fotográfica com flash embutido, foco e distância em automático e um motorzinho que avançava o filme na medida em que se fotografava; tecnologia de ponta para a época. Hoje, embora ele ainda a tenha, pouco usa, adquiriu uma digital que tem vídeo e áudio.
Na outra caixa um aparelhinho, com um visor parecendo uma lente e uma telinha, que ele não entendeu para que servisse. Era novidade.
Recordou, por sua curiosidade fixara-se na câmera querendo saber como funcionava fazendo mil perguntas que o tio explicava com carinho dizendo que ele iria tirar fotografias coloridas e slides iguais aos que ele trouxera da viagem e que iria mostrá-los. Para isso usaria o tal aparelhinho.
O tio Alfredo colocou um dos slides na ranhura do dispositivo, focalizou e, colocando-o no lado direito pediu que ele olhasse pelo visor. Seu primeiro movimento foi passá-lo para o olho esquerdo e o que ele viu foi a reprodução colorida da Estátua da Liberdade. Tempos depois iria vê-la e fotografá-la com a câmera que ganhara.
No segundo slide, o do Empire State, repetiu a troca e levava sempre o visor para o lado esquerdo, despertando a atenção do tio, que perguntou a razão de mudar de vista.
Respondeu:
- Eu não consigo ver!

O tio tampando com a mão sua vista esquerda perguntou o que ele via. Sua resposta foi que só enxergava vultos.
Naquela mesma semana sua mãe o levou ao oftalmologista que na consulta deu graças por terem descoberto a anomalia a tempo de corrigi-la, caso contrário perderia a visão.

No mês seguinte foi operado com sucesso. Oito anos mais tarde ingressava na Escola Naval.
Na mesinha da sala do apartamento de Carlos Augusto no Rio de Janeiro em uma pequena caixa de vidro está o aparelhinho com um único slide que mostra sua foto de menino com uma tarja preta no olho esquerdo. Em uma plaqueta de metal a inscrição: Meu melhor presente.
Quando as pessoas perguntam o que ele tinha na vista esquerda, Carlos Augusto diz:
"Nada, essa era a vista boa que tinha que ficar tapada para que eu me acostumasse a ver com a outra..."

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