sexta-feira, 23 de outubro de 2009

CONTOS DO MUNIR - 14

PAURA
Submarino Bahia... Adestramento... Área Alfa... Proximidades da ilha Rasa.

O treinamento dos oficiais alunos do curso de submarinos estava próximo do final. A alegria era contagiante, pois todos já se julgavam craques em submarino, solucionando com rapidez as situações de emergência boladas pelos professores.

Durante o exercício, conduzido pelos instrutores do curso, a música suave, vinda da Praça D’armas, acalmava o estresse das surpresas dos qualificandos, provocadas pelas artimanhas de avarias simuladas.

O comandante na torreta, despreocupado, conhecedor da capacidade dos oficiais encarregados do curso, selecionados por suas experiências, exercitava, com sua equipe, a solução de um ataque sonar virtual a um comboio em um problema gerado pelo computador de bordo.


O submarino navegava escoteiro em águas interditadas ao tráfego marítimo.

As emergências se desenvolviam: uma banda repentina ao imergir, um incêndio simulado com fumaça em um dos motores elétricos, uma falha no leme horizontal de vante ou de ré, falta de pressão no sistema hidráulico, válvula de ar de alta pressão emperrada, alagamento no compartimento de torpedos à ré e outras tantas.

Súbito, o comandante é surpreendido pelo aumento total da força das máquinas, inclinação violenta para cima e o ar de alta pressão liberado para todos os tanques, trazendo rapidamente o submarino à superfície.

Sem alternativa e entendendo que algo de grave se havia passado para que os três oficiais no compartimento de manobra tomassem a providência de trazer o submarino à superfície em emergência sem consultá-lo, o comandante segue com os procedimentos no periscópio.

Já na superfície, o comandante pergunta apreensivo o que havia acontecido.

A resposta vem, em uníssono, dos três:

- Cumprimos sua ordem de Vir à Superfície em Emergência.

O comandante, estranhando, diz que não ordenou. Os oficiais da equipe de ataque que se encontravam com ele na torreta afirmam a mesma coisa.

Os três oficiais que haviam saído do compartimento de manobra se entreolham espantados e exclamam:

-Nós ouvimos!

Mistério a ser investigado!

Toma-se a decisão de prosseguir com o treinamento e o comandante resolve repetir a situação da hora do evento: todos os mesmos homens em seus postos anteriores, as mesmas simulações de situações críticas. Passam-se alguns minutos e nada acontece.

Alguém se lembra do detalhe de que a música irradiada não era a mesma. Como chegava de um toca-fitas, a música havia ficado para trás.

Inicia-se a música original:- “Paura Innamorata di Te”.

O mistério persiste, mas não por muito tempo. Depois de alguns momentos, ouve-se claramente o comandante ordenar:

-Emergência! Superfície! Superfície!


Desta vez o comandante estava junto aos oficiais no compartimento de manobra e se surpreende ao ouvir sua própria voz.

Deu para deduzir o que havia acontecido. Um oficial de bordo havia trazido um long-play com a música “Paura” e gravado no cassete do toca-fitas durante um exercício anterior.

Foram proibidas gravações em viagem.

Desfeito o segredo, o comandante volta para a torreta, manda descer o submarino à cota de 100 pés e ordena:

-Emergência! Superfície! Superfície!

PS :
Banda - inclinação violenta para um dos bordos.
Escoteiro - navegando sem companhia

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